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O que é o chão na dança contemporânea?

Por Lucas Fortunato

Foto: Reprodução
Foto: Reprodução

Ao pensarmos em uma história da Dança como Arte, temos, de forma bem generalista, três momentos distintos, que remetem a uma dança clássica, moderna e contemporânea.


A primeira tem coreografias mais rígidas, ou seja, com movimentos bem definidos, que objetivam ser entendidos e reproduzidos. No século XX, a dança moderna surge como oposição a esse rigor clássico, propondo movimentos mais livres e bem expressivos. Hoje, a dança valoriza a diversidade física e cultural, por isso a concepção atual entende essa manifestação como a movimentação intencional do corpo, contra qualquer tipo de regra que limite suas formas de expressão, valorizando o “dançar” em si como objetivo estético.  


Nesse sentido de superação dos valores tradicionais, o contato direto e orgânico com o chão ganhou grande notoriedade no século passado, a partir das expressões modernas, e hoje, é recorrente nas experimentações contemporâneas de Dança.


Isadora Duncan, um dos maiores nomes dessa linguagem artística, já propõe nas primeiras décadas do século XX, por exemplo, coreografias com pés descalços, em oposição às clássicas sapatilhas do Balé.


Pode parecer banal, mas assumir a existência e a realidade do solo é uma importante inovação no campo das linguagens corporais.



A arte contemporânea valoriza muito a simbologia e a vivência do corpo, como se poderá verificar mais enfaticamente nas artes performáticas. Assim, a gravidade, que enfrentamos a todo o momento para nos mantermos de pé; e o próprio chão, que nos serve de base, são considerados fundamentais para a consciência humana acerca do movimento e tornam-se, dessa forma, protagonistas junto ao corpo na Dança. 


A arte clássica idealizava um corpo inexistente, assim, suas danças propõem saltos e giros, deslocamentos verticais que emancipam o bailarino do chão. É claro que a percepção visual e tátil, seja do palco ou qualquer outro tipo de solo, é fundamental e acompanha todas as manifestações de dança, uma vez que o espaço – e todos os elementos que o compõem, são elementos da própria coreografia.


Mais do que esse “sentir o chão”, que se exercita desde as danças clássicas, entretanto, a dança moderna lembra e reforça a sua existência, experiência essa que ganha dimensão ainda maior na contemporaneidade.


Por isso, a Dança passou a ser também uma forma de contato sensorial entre o chão e o corpo. O solo é nosso alicerce de todos os dias, é a base literal de nossa vida. Os pés descalços o alcançam mais direta e visceralmente. A gravidade é a força de nossa existência, vivenciada a todo momento. O corpo que se deita, rola, toca o chão em toda a extensão de sua pele, entrega-se a ela, abraça-a e a reconhece.


A dança contemporânea dialoga com a percepção e a reflexão sobre a realidade. Por isso, curiosamente pode-se dizer que suas expressões tão livres, irreverentes e espontâneas, são também aquelas mais “pé no chão”.

 

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Lucas Fortunato é professor de Arte, pesquisador no campo do Cinema-Educação.

 

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