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Não somos escravos



Estranho pensar como algumas pessoas não conseguem ficar sozinhas. Rádio, televisão, internet, vizinhos, trabalho, família, tudo ocupa o tempo e a mente. Muita gente anda totalmente ligada, conectada, numa angústia incessante de driblar a solidão. Há uma frase do poeta Fernando Pessoa, no “Livro do Desassossego”, que diz: “A liberdade é a possibilidade do isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo”. Qual seria o problema de algumas horas por semana ficarmos a sós, “eu e mim”? Que medo as pessoas têm do silêncio, tão aterrorizante, para aqueles que, mal chegam em casa, ligam a tevê ou o rádio, para terem a impressão de estar em companhia de alguém? Atualmente, até as igrejas deixaram de ser lugares silenciosos. Qualquer ofício religioso que se preze, hoje em dia, tem que ter música (e bem alta!), instrumentos nada acústicos, como guitarra, gritos, palmas e, não raro, danças. Não faço aqui nenhum julgamento da fé de ninguém, mas creio ser difícil, no meio desta confusão sonora, ter uma conversa íntima com Deus. Não somos escravos, aqueles “escravos” do Pessoa. O silêncio e a solidão promovem, antes de tudo, a escuta interior. Dentro de nós há gritos diários, ensurdecedores; vozes que ecoam de nossos corações e mentes; ruídos do inconsciente; estrépitos de nossas almas, que soam como trovões... Mas nós não ouvimos. Não atentamos a nossa própria voz, enquanto estamos ocupados em ouvir a tevê. Não podemos olhar para nós mesmos, porque estamos assoberbados com a “selfie” do “look do dia” no espelho; espelho este que reflete a aparência, muitas vezes, ou quase sempre, bem distante da nossa essência. A solidão não é um monstro. Praticá-la pode ser um belo exercício de autoconhecimento. Reservar uma hora do dia para ler, meditar ou fazer uma caminhada pode revelar grandes surpresas sobre nós mesmos. Ficar em casa, abrir o seu vinho preferido e saboreá-lo na presença de si mesmo é uma delícia, principalmente sem a interferência externa, que, algumas vezes, contamina o sabor da bebida, com conversas, risos, que nos roubam a merecida atenção da uva. Experimente ir ao cinema sozinho. Discuta consigo mesmo a fotografia do filme, o roteiro ou a atuação dos atores. Viaje sozinho, sem medo. Quanta coisa aprendemos com nós mesmos! E quantos sonhos, medos, verdades, desejos, ideias estão dentro de nós, guardados, à espera apenas de um minuto de nossa atenção.


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