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A Capela de São João Batista, uma resistência no Pontal, por Erick Bernardes


A Capela de São João Batista/Foto: Erick Bernardes
A Capela de São João Batista/Foto: Erick Bernardes

A história se deu no momento exato em que decidi visitar a Capela de São João Batista no bairro do Pontal. Teimosia, vontade de escrever, impertinência de escritor.


Alô, Dona V. (suprimi o nome da secretária para não cair em sacrilégio), como faço para visitar a Capela?


Bem, caro leitor, o chá de cansaço começou antes de dezembro.


— Posso ir amanhã, Dona V.?


— Na segunda não pode. Na terça também não, melhor semana que vem. Após duas da tarde. Não, melhor dezesseis horas. É rápido? O que você quer saber?


Eu só buscava autorização para entrar na capela. Fui assim mesmo, sem medo do acaso. O Uber não demorou muito. Chegamos eu, o Uber (que foi embora) e meu bloquinho de anotação. Sozinho, no portão da capela, bati palmas e chamei.


— Ôh da capela, senhora, por favor, eu liguei para a Dona V. há alguns minutos. Ela disse que era só eu vir aqui e pedir.


As duas mulheres no portão, já aparentando ao menos uns cinquenta anos cada uma, sorriram bastante simpáticas, porém não puderam me proporcionar a entrada na capela. Exato, uma pena, mas não consegui êxito na visita. "— Ih, moço a chave quebrou ontem, durante a reza do terço, dentro da fechadura. A porta de trás também não abre porque travou há três anos", justificou.


Incrível o poder do acaso movendo pauzinhos para outro desfecho. Entretanto, necessário reconhecer, as duas senhoras não tiveram culpa. O acaso agiu diferente, debochou do meu intento. Verdade. Consegui somente fazer duas fotos da fachada, e olhe lá. Mas confesso que aprendi bastante. Descobri a paciência divina dentro de mim. Um sorriso no rosto, tchau para vocês então, amáveis senhoras, agradecido.


O fato de eu ter retornado ao meu quarto cabisbaixo e desconsolado por ter dado com burros n'água não significa que abandonei a causa. Exatamente, necessário admitir que as amizades salvam o cronista e o tornam sobremaneira resiliente.


— Alô, Henrique, tudo bem? Sabe alguma coisa sobre a capela de São João. Lembro que você me contou bastante sobre o assunto.


— Claro, o pouco que sei posso compartilhar...

... e foi assim, essa é a história, Erick.


Conforme narrou o meu amigo, uma das simpáticas senhoras, das que me receberam de chave quebrada na mão, era ninguém menos que a filha do responsável pela tal capela ainda se encontrar de pé, o falecido líder comunitário Valti Arraia. Exato, narraram que, quando na época da construção da BR 101, uma das capelas nomeadas N. Sra. da Conceição fora demolida no intuito de se construir a discutível rodovia. A segunda a ir para o chão, por causa do pseudoprogresso fluminense, seria a de São João. Porém, não houve demolição. O líder Valti Arraia se lançou na frente do trator, convocou a comunidade ao abraço conjunto no entorno da capela. Logicamente isso obrigou o empreiteiro responsável a mudar de planos. Pensar diferente, e assim se fez.


— Não percebe, Erick, que há uma rua contornando a capela? Isso até que isolou de alguma forma a estrutura da construção. Mas foi assim, abriu-se uma rua por trás e houve um final feliz. Quanto à fundação desse patrimônio, não sei, ignoro inauguração da Capela São João.


— Gratidão, meu caro. Salvou meu dia de pesquisa.


Acaso o leitor tenha ficado curioso quanto à fundação, eis aí: de acordo com Maria Nelma C. Braga, a Capela de São João Batista, datada de 1646, fora erigida no antigo Porto da Ponte, hoje nomeado de Pontal.


Nota: Segundo informações da professora Maria Nelma C. Braga, era lá que os franceses aportavam, visando a hostilizar o fundador de SG, o sesmeiro Gonçalo Gonçalves. Havia no Pontal um enorme túnel onde os marujos se escondiam. A capela teria sido restaurada pela primeira vez em 1871 e, posteriormente, abandonada para só ser restaurada pela segunda vez em 1985 (BRAGA, 1998, p. 70-71).


Fonte: BRAGA, Maria Nelma Carvalho. O município de São Gonçalo e sua história. 2ª ed. São Gonçalo, RJ: Falcão, 1998.

Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.





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