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Deusedino Dantas - por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS

Foto: Reprodução Internet
Foto: Reprodução Internet

Favela do Gato, Gradim, São Gonçalo. Antigamente Praia da Yamagata. Em sua orla foram erguidas há muito tempo vários barracos, antes verdadeiras palafitas, moradas insalubres, geralmente habitadas por pescadores, imigrantes de todas as partes do país e sem teto locais, a única diferença para os dias atuais é o concreto e o tráfico de drogas, continuamos com as mesmas necessidades, assim como o resto do país.


Deusedino Dantas era um humilde pescador, acordava às duas horas da manhã, todos os dias e saía em sua pequena embarcação para buscar no mar o sustento da família. Nos domingos pela manhã batia uma bolinha ali no Campo do Saíra, atrás da fábrica de pescados enlatados Orleans.


Num domingo desses houve uma batida policial, cercaram o campo por todos os lados e vieram fazendo a varredura, procuravam um perigoso bandido chamado Dedanha. Foram dispensando um a um dos presentes até chegarem a Deusedino Dantas.


Descobriram que Deusedino Dantas era pai de Dedanha e o torturaram muito para que desse o paradeiro do filho. Por mais que apanhasse e sentisse as dores das pancadas de cassetetes no peito, costelas e costas, Deusedino Dantas nada disse e tantas foram as pancadas que acabou por falecer.


Já naquela época um auto de resistência foi lavrado, o corpo de Deusedino Dantas enterrado sob aplausos e gritos de palavras de ordem de revolta pelos vizinhos e dos defensores de direitos humanos, na época considerados comunistas e defensores de bandidos, como até hoje os são chamados por alguns.



Seis policiais civis e um delegado foram responsáveis pela operação. Na manhã seguinte ao enterro de Deusedino Dantas, o detetive Peçanha e toda sua família amanheceram mortos a tiros. Peçanha tinha o rosto desfigurado. Em sete dias as famílias dos sete policiais foram exterminadas, uma a cada dia, não sobreviveu nenhum familiar. Aquelas árvores genealógicas foram cortadas para nunca mais brotar.


No túmulo de Deusedino Dantas apareceu, no sétimo dia, uma coroa de flores com os dizeres:


“A JUSTIÇA É CEGA, PORÉM, TEM AUDICAO, OLFATO, TATO E O DOCE PALADAR DA VINGANÇA. DESCANSE EM PAZ MEU PAI.

DO SEU AMADO FILHO, DEDANHA.”


Dedanha seguiu pela vida fazendo justiça com as próprias mãos e um dia desapareceu do bairro. Todos o julgaram morto e sua história corre até hoje pela boca dos mais velhos, griôs locais que não deixam as histórias morrerem.


Lá na Serra de Gaviões, entre Rio Bonito e Casimiro de Abreu, mora um solitário caçador com sua velha mula, vem uma vez por mês à cidade, abastece o galão de querosene para alimentar a lamparina e o galão de cachaça para alimentar sua solitária alma.


Em seu minúsculo barraco de apenas um cômodo possui uma cama, uma pequena mesa, um fogão a lenha onde tem sempre uma caça sendo defumada e uma pequena cômoda onde está um porta retratos com a imagem de seu velho pai Deusedino Dantas sorrindo com uma fieira de peixe nas mãos. Na região ninguém sabe de onde ele veio e nem como apareceu ali.


É querido por todos, quase não fala e vive por viver. Na região é chamado de Didino, ninguém imagina que quando criança, na escola, era Deusedino Dantas Filho e na vizinhança do Gradim era conhecido por Dedanha, o justiceiro.

 

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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.


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