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Esmeralda, por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS

Desenho de Lan - In Memorian
Desenho de Lan - In Memorian

Ele andava mais angustiado que compositor de samba de enredo que dava como certa a vitória e acabou alijado da disputa numa noite de semifinal. Também pudera, foi abandonado por Esmeralda, o grande amor de sua vida a quem devotou todo sentimento e trabalhou duro por anos a fio para satisfazer-lhe os caprichos.


Esmeralda foi uma mulher linda e cortejada por todos os poderosos da cidade, teve seus momentos de glória ao enfeitiçar o público com seu andar de Deusa nas passarelas em concursos de miss. Ocorre que o tempo passa para todos os seres viventes. Alguns admiradores foram à bancarrota apostando alto nas corridas de cavalo e mesas de jogos, outros saíram de cena depois de conseguirem um tempo de atenção e carinho daquelas mãos de fada e ela ficou à deriva como um barco com o motor quebrado depois da tempestade.


Jovino sempre nutriu por ela um amor, daqueles de novela, aquela paixão que faz a gente andar com a cabeça debaixo do braço para não perdê-la de vista porque o resto já estava entregue a ela, alma e coração. Pegou-a quase na sarjeta, levou para casa, comprou roupas novas, levou ao salão e deu uma recauchutada geral, levou também ao dentista que trocou aquele sorriso já amarelado quase preto por cintilantes frontais e caninos de perfeição ímpar. O hálito, quando ela falava já inebriava os interlocutores, a bela e fogosa Esmeralda estava voltando aos tempos de glória, até as mais belas moçoilas do pedaço já a olhavam com inveja. Jovino era só alegria, ninguém podia falar dela, tocá-la então era como se pedisse a sentença de morte.


A festa de São Tinhorão da Serra está no calendário nacional e uma enorme quantidade de turistas é esperada na cidade todos os anos. O ponto alto é um desfile de homens nus correndo sobre um tapete de brasas com uma rosa branca nas mãos e o primeiro que chegar aos pés de São Tinhorão e depositar a rosa é o grande vencedor. Jovino correu anos a fio e era o vencedor em todos eles. Em sua mente, enquanto corria, visualizava Esmeralda de braços abertos e corpo nu esperando o mais viril, o mais gostoso dos homens, pelo menos em sua mente apaixonada.


Neste ano meus amigos, Jovino sonhou com a realidade, Esmeralda, linda, apaixonada e nua estaria a sua espera na linha de chegada aos pés de São Tinhorão. Jovino chegou à primeira barraca, a de Breck, onde todos os amigos se encontravam, tirou toda a roupa, tomou sua dose da habitual bebida e se enfileirou com os demais concorrentes. João Gualberto Bolinha, que era o juiz da corrida conferiu se todos estavam em posição e gritou: _ I é um..., I é dois..., I é três..., I é jà!!!!!


Jovino correu com os olhos cravados na rosa e, nos pés, sentia um frescor como se tivesse pisando em pedras de gelo, as pessoas gritavam: _ Jovino! Jovino! E ele corria, corria, corria... e os gritos foram ficando mais fracos: _ Joviiiinooooo, Joviiiiiiinoooooo!!! Até que ele levantou a cabeça e percebeu que enquanto sonhava os outros concorrentes o ultrapassavam, Esmeralda já não estava lá, o chão em brasa já queimava lhe os pés, o público que gritava seu nome agora gargalhava de sua derrota, ele não estava entendendo nada, trouxe uma torcida imensa para aplaudir sua passagem e jogar pétalas de rosas quando ele, vitorioso, levantaria Esmeralda nos braços e a faria rainha e dona daquela Cidade. Ledo engano, Esmeralda, após cantar, dançar e beber pelas ruas acabou adormecendo na casa de Teixeira da Horta que ganhou a corrida e a companhia de sua amada. Jovino jurou nunca mais olhar para Esmeralda, preferia vê-la morta a ter que trocar palavra com ela.


O que ele não sabia é que Teixeira da Horta não tinha nenhum interesse em Esmeralda, tudo o que ele fez, aquele sacrifício todo para ganhar a corrida e levar Esmeralda para casa era pra fazer ciúmes a Filomena, o grande amor de sua vida. Jovino ainda está muito magoado mas o sangue esfria, a paixão renasce e o coração perdoa. Volta Jovino!!!!!!!!

Paulinho Freitas é cantor, compositor, sambista e escritor.



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