top of page

João Vitor - por Mário Lima Jr.


Foto: Reprodução
Foto: Reprodução

João Vitor tinha 17 anos, gostava de pescar e morava no Complexo do Salgueiro, no bairro Itaoca. Era integrante de uma congregação evangélica no mesmo bairro. Testemunhas disseram que dois policiais escondidos na mata fizeram os disparos que atingiram João na última sexta-feira, 20 de agosto. Com uma mistura de tristeza, surpresa e revolta, o relato das testemunhas foi gravado por impulso no local, imediatamente após a tragédia, e compartilhado com amigos pelas redes sociais. Por medo da reação dos policiais presentes, as testemunhas não se aproximaram da vítima para socorrê-la. Em São Gonçalo, sabemos que a polícia mata menores de idade inocentes e toma posse dos seus corpos, aconteceu com outro jovem chamado João no mesmo bairro, em maio do ano passado.



João Vitor voltava de moto de uma pescaria com Alexandre, de 19 anos, que também foi atingido pelos tiros mas segue com quadro de saúde estável. Com tanto medo quanto as testemunhas, a mãe de Alexandre preferiu não se identificar ao conversar com jornalistas. Humilde, contou a história do filho, suas alegrias, suas preferências, sem revelar o próprio nome. É difícil acreditar na Justiça, ou dizer quem é polícia e quem é bandido, quando até a mãe de um jovem baleado tem medo de quem deveria proteger.



O socorro veio de moradores da região, o pobre só tem o pobre para ajudá-lo, mas João Vitor não resistiu aos ferimentos e morreu no Hospital Alberto Torres. A família dele está em choque, quem reconheceu o corpo do jovem foi o próprio pai. Indignado, desesperado, sem saber pra onde olhar, o que tocar, o que fazer, o homem colocava a palma da mão na testa e chorava na porta do Instituto Médico Legal. Os gestos do pai de João Vitor refletem uma cidade de um milhão de habitantes atormentados pela violência, onde jovens amigos podem ser mortos pela polícia depois de uma pescaria ou brincando dentro de casa.



Diante do óbvio, que a polícia do Rio fuzila pobres e negros por prazer, as mentiras contadas na versão policial se tornaram mais criativas. Sobre o crime de sexta-feira, a polícia alega que Alexandre, único sobrevivente, gravou um vídeo dizendo que os tiros partiram de traficantes de drogas. Questionada pela imprensa, a polícia não revela em que condições o vídeo foi gravado. E a mãe de Alexandre nega que o filho tenha gravado qualquer vídeo (G1).



O jovem gonçalense é assassinado no Salgueiro. O jovem gonçalense é assassinado na Praia da Luz, de tanta importância histórica e potencial turístico e econômico, mas dominada pelo crime. O jovem gonçalense também é morto sob o sol, segurando um pacote de balas na mão, tentando arrumar uns trocados nos sinais de trânsito. Ou comendo a poeira dos veículos que vigia nos estacionamentos, quando deveria estar estudando. E nada, nem ninguém, tem a pretensão de defender a vida dos jovens de São Gonçalo.


***

Este texto apareceu primeiro em mariolimajr.com.

Mário Lima Jr. é escritor.





POLÍTICA

KOTIDIANO

CULTURA

TENDÊNCIAS
& DEBATES

telegram cor.png
bottom of page