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O Rio de Janeiro continua lindo! Por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS

A sexta feira chegou trazendo um céu cinzento, triste e com as lágrimas de Deus banhando esta Cidade que o mundo ama. Mas trabalhar é preciso. Então lá fui eu às 5 da manhã pro batente. Lá pelas 10 horas fui resolver alguns assuntos pendentes no banco. A cidade não para, mesmo com aquela chuva fininha e um ventinho frio que parecia vir lá da espinha dorsal pra fora, as pessoas estão lá, de um lado para o outro com semblantes preocupados em dar conta de tantos afazeres. Neste momento dá aquela vontade de voltar a ser criança, quando as mães preparam aquele mingauzinho de aveia com aquela canelinha em pó por cima, todos deitados no chão da sala vendo televisão. Ô vidão!


Só que acordar também é preciso, e rápido, pois não há relógio que espere alguém. Enquanto você sonha o destino age e a vida anda. Entrei num metrô lotado e mais frio que lá fora por causa do ar condicionado, desci na estação Cinelândia, entrei pela Rua Santa Luzia apressado por causa da chuva e rapidamente cheguei ao banco. Tudo resolvido empreendi caminhada de volta ao escritório. Aí é que as surpresas começaram a acontecer.


Eu, logo eu, filho de Zé Fialho, um dos maiores malandros que esta Cidade já viu, nascido e criado em São Gonçalo do Amarante, terra de Turí-Turé vou dar uma de otário! Tudo começou quando atravessei a Av. Presidente Antônio Carlos e vi uma senhora, bem idosa, chorando copiosamente e andando de um lado para o outro na frente da Igreja de Santa Luzia, deixei que ela fosse para um lado e quando voltou estava de frente a mim, perguntei por que chorava e ela se lastimava que morava na Ilha do Governador e tinha perdido todo o dinheiro da passagem, precisava de oito reais para ir embora. Nem titubeei, meti a mão na carteira, tirei dez reais e entreguei a pobre senhora, que toda feliz se despediu de mim e foi embora. Não deu tempo nem de me sentir bem com aquela boa ação, logo que me virei pra seguir meu caminho levei um abraço sem pedir de um cara de mais de metro e oitenta com mais dentes na boca que um tubarão e já deitando falação:


_“ E aí meu camarada! A quanto tempo não te vejo! Como vai a família?”


E antes que eu pudesse respirar para responder ele pôs em minhas mãos um frasco de perfume dizendo que tinha uma loja ali na rua México e aquela mostra era pra presentear minha esposa. Antes que eu balbuciasse qualquer palavra ele me deu outro frasco e emendou:


_”Leva este também, é masculino, é pra você, paga só o almoço que tá tudo certo.”


Argumentei que só tinha uma nota de cinquenta e quando mostrei a nota o sujeito já a pegou a nota e me deu trinta reais de troco, me abraçando mais uma vez se despediu antes que eu pudesse piscar os olhos. Saí andando meio confuso em direção ao metrô, quando já estava descendo as escadas deparo com outra senhora com uma criança nos braços dizendo que a mesma estava passando mal de fraqueza e precisava se alimentar, a mulher chorava e a criança me olhava fixamente como se pedisse clemência, parecia que eu era um carrasco a enfiar-lhe o machado no pescoço. Sem titubear arranquei os últimos trinta reais que me sobraram e dei a mulher que já mudou o semblante, agora até sorria, a criança rapidamente deu um bote nas mãos da mulher e pegou vinte reais gritando:


_“Depois te dou cinco!”


As duas saíram lépidas e faceiras Av. Rio Branco à fora. Eu entrei no trem pensando: Sou uma besta mesmo! A velhinha, pela idade, não paga mais passagem, logo não precisava do dinheiro para este fim, o cara do perfume eu nunca vi na vida e o perfume é de péssima qualidade, joguei fora, e a mulher com a criança não era nem mãe e nem estavam com fome.

Burro, burro, burro! Vociferei pra mim mesmo, gesticulando fazendo as outras pessoas pensarem que eu estava louco.


Quando saí da estação Praça XI dei de cara com um cidadão carregando uma caixinha de engraxate de mãos dadas com um garotinho que já chegou chorando:


_“Tio, paga um almoço pra gente, a gente tá morrendo de fome.”


Eu logo retruquei:


_“Arruma pra três parceiro e me chama pra almoçar porque eu também tô na pendura.”


É galera, o Rio de Janeiro continua lindo!

Paulinho Freitas é compositor, sambista e escritor.





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