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Por um Setembro mais feliz - por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS

Imagem Setembro Amarelo: Reprodução Internet
Imagem Setembro Amarelo: Reprodução Internet

Na minha infância tive muitos amigos. Graças a Deus, muitos! Lembro com saudade de todos eles, todos tinham personalidades diferentes como tem que ser e discutíamos muito, discordávamos muito, mas nos amávamos muito também. Lembro que sempre rolava umas festas “americanas” onde cada um levava alguma coisa para comer ou beber. A casa de alguém era escolhida, um som potente, daqueles, tipo três em um era colocado na varanda e varávamos as tardes-noites dançando de rostinhos colados, sonhos nossos entrando nos sonhos delas. Ô tempo bom meu Deus!



Tinha aquele amigo mais cobiçado pelas garotas com aquele corte de cabelo do galã da novela das oito, ele fazia até o mesmo trejeito ao sorrir. As meninas suspiravam e faziam uma fila imaginária para dançar com ele. Quando ele não as tirava para dançar elas davam sempre um jeitinho, mulher quando quer não têm jeito, ela vai dar um jeito.


Na minha condição de preto, feio e pobre sempre era preterido na hora de chamar alguém pra dançar, mas a gente que é preto, feio e pobre também sempre damos um jeito de conseguirmos o que queremos. A gente se inventa, reinventa e vai vivendo. Não há tempo ruim pra gente. O não, era garantido, então na insistência acabávamos por vencer e ficávamos felizes o tempo todo e ríamos de nós mesmos o tempo todo e acabava que todo mundo gostava da gente por estarmos sempre de bem com a vida. Na verdade a gente ria de um mundo desigual pra caramba onde nem sempre o bom valia alguma coisa. Até hoje é assim, só, que como eu já falei, a gente é ruim e nada derruba a gente.



Meu amigo, que vou chamar Nonato, só pra não revelar quem é, tinha aquele corte de cabelo do galã da novela, aquele sorriso igualzinho e as meninas faziam aquela fila imaginária para dançar com ele. Mas tinha os finais de semana que ele não queria falar com ninguém, não saía de casa, não abria a porta do quarto nem pra mãe dele. Podia ter o sol que tivesse, a noite mais linda, a festa mais esperada que ele não saía. Eu achava aquilo muito esquisito. Cara metido! Esnobe! Ele queria era aparecer, todo mundo lá na porta dele o chamando pra sair e ele nem te ligo. Pois bem, lá ia eu me esbaldar nos embalos dos finais de semana à noite.



O tempo foi passando e Nonato era sempre daquele jeito. Uma semana era pau pra toda obra, na outra não queria falar com ninguém. Abandonou até um emprego de Office boy na antiga CERJ, cobiçadíssimo por todos nós e foi trabalhar na serralheria do Ozéas. Não entendi foi nada, mas vamos que vamos. Passamos pelo alistamento militar e fomos cada um tomando seu destino, mas sempre nos vendo esporadicamente. Nonato foi ficando cada vez mais caseiro e a galera naquele furor de juventude querendo alcançar um futuro que nunca vai chegar, porque a gente sempre quer correr atrás de outras conquistas a cada vez que alcançamos uma, nem percebeu que ele cada vez aparecia menos.



Numa manhã de primavera nonato não levantou para ver o sol lhe dar bom dia. Dormiu pra sempre com aqueles pensamentos que jamais saberemos quais foram. A gente se encontrou depois do enterro e ficamos ali na padaria bebendo refrigerante e comendo sanduíche de pão com mortadela, lembrando e gargalhando de nossa infância e adolescência. A gente não tinha ideia do que se passava na cabeça do Nonato, mas hoje a gente sabe que ele era depressivo. Por quê? Se ele sempre foi bonito, sempre teve tudo o que quis e sempre foi cobiçado pelas melhores garotas. Por quê? Não existe resposta.



Cada vez mais pessoas tiram suas próprias vidas. Por ser feio demais, por ser bonito demais, por ser pobre, por ser rico, por ter família, por não ter... Caramba! Por qualquer coisa essa infeliz dessa tal de depressão entra na vida da gente. Eu acho que o problema está na gente mesmo. A gente precisa se tocar mais, se abraçar mais, se ouvir mais. Por nós, pelos nossos, por vós e pelos vossos, por UM SETEMBRO MAIS FELIZ. Amém! Shalom! Aleluia! Axé! Salamalek! Saravá! Namastê! Tudo de bom que o universo puder te dar!

Paulinho Freitas é compositor, sambista e escritor.




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