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Relembrando o caso da Praça dos Ex-combatentes, por Erick Bernardes


O tanque/Fotos: Erick Bernardes
O tanque/Fotos: Erick Bernardes

É só uma praça em frente da Faculdade de Formação de Professores com um tanque de guerra ilustrando o local?


Bem, pergunta idiota merece resposta o quê?


Não, senhora, só isso não. Ali na Praça dos Ex-combatentes foi plantada uma semente de tanque de guerra, cresceu e agora o treco está grandão. Era verde como convém aos símbolos do exército, mas madurou, por isso a cor rosa na carenagem gigante. Igual a certas mangas que a gente encontra no pé, maduram e mudam de cor esses tipos de tanques também — informou o rapaz, debochando.


Pois é, necessário esclarecer a você, leitor. As cenas que encabeçam a crônica de hoje se passam no ano de 2015, quando um jovem cheio de ideias nada tradicionais decidiu tingir da cor rosa o monumento dedicado aos heróis apelidados de "pracinhas brasileiros" e que participaram da segunda guerra mundial. Mas, por causa da nova pintura que o tal monumento recebera, o assunto sobre a história do Brasil voltou à boca do povo e assumiu o foco no teatro social chamado notícia televisiva.


Cena 1:

Dentro do ônibus, o universitário dera lugar à passageira de cabelos grisalhos. Atitude cotidiana, se ao menos houver o mínimo de educação: jovem em pé, transporte lotado, idosa acomodada, trânsito parado, em frente à Faculdade de Formação de Professores da Uerj, e tudo por causa dos carros da imprensa. A senhora impertinente lançava perguntas sem nexo ao rapaz que vestia camiseta vermelha com a estampa do Che Guevara e ostentava cara de irritado. Evidente a ironia expressa pela referida septuagenária, impossível não perceber na fala da coroa a vontade de irritar o jovem estudante.


Cena 2:

Os sites e jornais do Rio se encontravam de atenções voltadas para o bairro do Patronato, município de SG, devido ao caso da pintura do monumento na praça. A mídia se alvoroçou feito abelha cachorro. Instigaram moradores a dar entrevista para a TV. Conclusão? Nenhuma matéria interessante de fato, só sensacionalismos de repórteres com fins de conseguir audiência e provocar discussão à toa.


Cena 3:

No banco de trás, eu explicava à minha primogênita a história de fundação do monumento em honra aos heróis fluminenses da FEB, Força Expedicionária Brasileira. E foi mais ou menos assim:


Filha, essa praça foi fundada em honra aos militares que lutaram bravamente na batalha de Monte Castelo, na Itália, entre 1944 e 1945. Era guerra mesmo, a segunda e mundialmente conhecida. O pessoal nem lembra mais da participação dos gonçalenses. Acontecimento de nível mundial motivou o ex-prefeito Osmar Leitão a fundar tudo isso aí, óh! Tem obelisco, mastros de hastear bandeiras, hélice de avião, munição e armas usadas na guerra. E o referido tanque doravante famoso, por ter assumido o tom rosa chiclete à semelhança da Peppa Pig dos episódios de animação. Enfim, trata-se um museu ao ar livre e muito bem estruturado. Mas se encontra assim, largadão, pichadão e negligenciado. Daí, acontece um caso polêmico como esse e pronto: o jornal da emissora do demônio mete as caras por São Gonçalo. Por que não vieram noutros momentos falar da história? Não seria uma boa pauta a vida do pós-guerra mundial dos referidos "pracinhas" gonçalenses e suas famílias? O que aconteceu com os heróis militares fluminenses, qual o suporte recebido por quem retornou vitorioso do front? Tristeza, negligência histórica, memória indo embora igual a rabisco de caco de telhas em dia de chão molhado. E a imprensa brasileira questionando sobre a cor escolhida para tingir o monumento de combate. Vê-se ao longe o intuito vazio da mídia. Indiscutivelmente atraídos pela superficialidade da pauta, a pergunta da jornalista: "vandalismo ou protesto?". Deus do céu, pergunta mais idiota. O caso é outro, mais complexo, a história que se esvai. Nada a ver com o caso do tanque pintado.


Viu aí, caro leitor? Está claro o descaso acerca da história do Brasil. Imagine o assunto envolvendo contingente militar gonçalense em honras e glórias? Nunquinha que vão dar importância.


Nota do autor: há ótimos escritores que resistem e conseguem não deixar se apagar essa parte importante da nossa história. Para relembrar os fatos, me debrucei novamente nos textos escritos pelo professor André Correia e pelo jornalista Rennan Rebello. Além de ler pela primeira vez o delicioso HQ do tipo Mangá (aliás, recomendo) do escritor Antônio Júnior, também ele um querido entusiasta da Força Expedicionária Brasileira.


Conheça a praça dos Ex-combatentes no vídeo:


Referências:

JÚNIOR, Antônio Carlos Pinto da Silva. Smoking Snakes - Relembrando os Bravos. Rio de Janeiro: Oba books, 2018.










Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.




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