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Sobre a (in)adequação curricular, ou sobre a maior fraude educacional cometida nesse país

Por Hélida Gmeiner Matta

Foto: Reprodução Internet
Foto: Reprodução Internet

Em 13 de março de 2020 as aulas nas escolas brasileiras foram suspensas. Pensava-se que em 15 dias, um mês no máximo, seriam retomadas. Não foram. Na verdade, só em 2022 as aulas presenciais plenas retornaram, como antes da pandemia.


Nesses 24 meses, foram muitos esforços de educadores e familiares. Muitas experimentações e novidades foram tentadas. Os gestores da educação se disseram "empenhados" e "conscientes". Não obstante, não fizeram os investimentos necessários e milhares de crianças e adolescentes foram forçadamente "avançados" nos anos de escolaridade.


Hoje o que encontramos nas salas de aula, são crianças profundamente prejudicadas pela ausência da experiência escolar nesses meses. Há estudantes no primeiro ano que não viveram um dia sequer de educação infantil. Além de estarem, até certo ponto, privadas do desenvolvimento social esperado, elas vêm de um intervalo de 24 meses. 24 meses de um total de 72 meses dessas crianças. É um intervalo e tanto.


Não que elas não tenham aprendido nada, nem se desenvolvido nesses meses, mas foi uma experiência absolutamente diferente da que sustenta a aprendizagem que a escola espera nessa fase.



Os sistemas educacionais trabalham com a ideia de hierarquia de aprendizagens, sejam organizados por séries ou ciclos. Há uma espécie de sequência de conteúdos e saberes nessa organização. Não que tenha que ser assim, mas o fato é que é. Por isso também, cada estudante, independente de em qual ano da escolaridade esteja, foi profundamente afetado pelo "intervalo" da pandemia, especialmente aqueles cerceados das aulas on-line devido à falta de equipamentos e rede.


Pois bem, sabe o que eles e nós educadores e educadoras encontramos nessa volta às aulas? Os mesmos livros, planejamentos, testes, atividades, de cada ano. Igualzinho a antes da pandemia: "Espera-se que uma criança de primeiro ano, ao final do primeiro trimestre, seja capaz de…" o mesmo que estava escrito em janeiro de 2020!


Nenhuma adequação curricular, conforme foi afirmado que haveria pelos gabinetes das gestões educacionais dos governos.


O intervalo de tempo acabou, mas as fichas dos alunos dizem que não houve nenhum intervalo. Se estavam em 2020 no terceiro ano, completando o primeiro ciclo da alfabetização, chegaram em 2022 no quinto, às vésperas de deixar a escola! Seu livro é um livro de quinto ano. Pouco importa que ele não tenha completado sua alfabetização.


As avaliações externas ao que parece, tampouco serão aplicadas considerando a lacuna.


Escrevo esse texto como compromisso em tornar pública a indignação de colegas, professoras e professores desesperados, nessa pantomima que se tornou o cotidiano nas escolas brasileiras, com quem divido o dia-a-dia. Seria cômico se não fosse trágico.


Colaboração e Revisão Alba Nascimento.

 

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Hélida Gmeiner Matta é professora da Educação Básica da rede pública. Pedagoga, Especialista em alfabetização dos alunos das classes populares, Mestre em Educação em Processos Formativos e Desigualdades Sociais e membra do Coletivo ELA – Educação Liberdade para Aprender.



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