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São Gonçalo sob o olhar infantil, por Mário Lima Jr.


Os mais prejudicados pelas falcatruas na política de São Gonçalo, as crianças que dependem da educação e da saúde oferecidas pelo município, são aqueles que trazem consigo mais esperança por dias melhores. É algo surpreendente, que a lógica nos impede de acreditar, e que somente pode ser explicado pela maravilha da vida.


Claro que existe tristeza, elas não se esquecem nem por um segundo das violências sociais que sofrem dentro das comunidades sem saneamento básico ou lazer dominadas pelo tráfico de drogas. Sob o olhar infantil, São Gonçalo é uma cidade com todas as limitações e problemas vistos pelos adultos, a diferença é que a capacidade de sonhar das crianças, bem como sua curiosidade, não são afetadas pelas deficiências que paralisam os mais velhos dentro da reclamação de que “São Gonçalo não tem futuro”.

Estamos em 2019 e muitas brincadeiras das gerações anteriores ainda são encontradas nas ruas, mantidas vivas pelas crianças de hoje. Quando o tiroteio começa, todo mundo corre pra dentro de casa e bate o portão. Alguns minutos depois, a garotada volta a brincar e rir alto de novo. Não enfrentar esse risco seria uma morte antecipada, incompatível com a natureza infantil.


Se a cidade ainda se diverte nos reduzidos momentos de liberdade, ainda há esperança. Para as crianças do município, não ter espeança não é uma escolha. São Gonçalo está começando a vida agora, junto com elas. Com problemas, mas inacabada. De forma alguma elas veem a cidade condenada a um destino infeliz.



A convite da professora Marilyn Pires, visitei este mês o CIEP Municipalizado Rosendo Rica Marco, no Gradim, e fui entrevistado pelos alunos da professora. Entre eles não havia olhares perdidos, derrotados, como vemos na multidão de adultos que se arrasta carregando sacolas de compras no Centro da cidade e no Calçadão de Alcântara. A característica mais marcante dos alunos era a vontade de crescer e ser alguém do qual eles e a sua cidade vão se orgulhar no futuro.


Entre as perguntas da entrevista, qual era minha profissão e em qual bairro eu morava. Queriam saber como eu ganhava a vida em São Gonçalo, não perguntaram se eu tinha planos de me mudar da cidade, questão que se tornou frequente nas conversas nos bares, restaurantes e shoppings. Se mudar não é uma opção viável para a maioria esmagadora da população de mais de um milhão de pessoas que aqui vivem, por isso precisamos lutar de alguma forma.



As crianças são capazes de enxergar as possibilidades que a desordem esconde. Quando eu era criança, não sentia ódio da bagunça de Alcântara, ficava fascinado por ela. E não há nada mais abundante na área urbana de São Gonçalo do que desordem e lixo, cada copo de guaravita no chão representando dinheiro jogado fora que poderia ser transformado em recursos públicos. A cidade não se torna um polo fluminense de reciclagem porque é administrada por políticos dedicados a elevar seus ganhos mensais. Se seus gestores amassem o território com a inocência das crianças, os adultos também teriam esperança.

Mário Lima Jr. é escritor. Leia esse e outros artigos no blog do autor.



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