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Temos fome, fome de Esperança, por Sammis Reachers


Hope, 1886. George Frederic Watts
Hope, 1886. George Frederic Watts

Uma pintura do inglês George Frederic Watts, atualmente exibida na famosa Tate Galery de Londres, apresenta uma significativa alegoria: uma mulher com os olhos vendados, sentada sobre o globo terrestre, tendo em suas mãos um alaúde. Todas as cordas do instrumento musical estão arrebentadas, menos uma. A mulher aparenta estar atenta à música tirada desta única corda – essa corda é a Esperança.

Vivemos tempos sombrios. A desesperança, seja ela em utopias materialistas ou religiosas campeia, alimentada pelas brasas do ódio que insiste em bradar de sarjetas a tronos, passando por (quase) todas as tribunas. No Brasil, o espectro político hiperpolarizado, com as vozes da concórdia e do sapiente “caminho do meio” sufocadas, ou pior, acusadas de mascararem “isentões”, é ferramenta para as hostilidades das extremas direita e esquerda. O diagnóstico é triste e a pílula, difícil de engolir: nossa sociedade está doente. Doente da alma, ferida em seu humanismo no que ele tem de mais nobre e fraternal; doente de suas fés religiosas, com o uso distorcido de suas mensagens de paz para fins eleitoreiros, interesseiros e intolerantes. Nossa situação calamitosa de desigualdade social, que volta a crescer com o neoliberalismo covarde (perdoe a redundância, amigo leitor) do milionário (sintomático, hum?) Paulo Guedes, trabalha furiosamente para dinamitar as esperanças que nos restam e resistem.



O que vemos por aí é maniqueísmo que se chama: a crença de que o bem puro e o mal puro se digladiam. Mas quem é o mal? O mal é o próximo, o outro, nunca eu. Nunca você. O mal é o coxinha que quer proibir os livros de Marx na escola. Ou o vermelho que quer dinamitar igrejas. Fácil, não? Mas somos humanos, e pelo entendimento bíblico, seres transidos de fios de mal e bem, acertos e erros – sim, a Bíblia e a maioria das grandes religiões mundiais nos referem como seres em processo, cuja jornada é a própria formação. Livres em nossas circunstâncias, que nos limitam em parte e em parte condicionam, mas são impotentes para aniquilar o que temos de divino. E esse toque “divino”, fino fio que nos mantém de pé, frágil filamento que nos une uns aos outros, que conduz (para nós, através de nós e a partir de nós) uma certa pulsante corrente elétrica, é a Esperança.

É preciso esperançar. Acreditar contra nossas diferenças, resistir contra os flagelos e os flageladores, os verdugos à serviço da exclusão e do maniqueísmo. Suas agendas não são as nossas; sua estreiteza não nos diz respeito. Martin Luther King, o grande pastor e líder civil da mais singular expressão, assevera: “Devemos aceitar a decepção finita, mas nunca perder a esperança infinita”. E conclui: “Se eu ajudar uma pessoa a ter esperança, não terei vivido em vão”.


Aquela única corda da alegoria de Watts, citada no início deste texto, fio solitário, é na verdade uma ponte. Sim, é uma ponte a Esperança, fio a co-ligar e conduzir o homem (indivíduo e sociedade), e cabe a cada um de nós o papel de seus arautos, de pontífices (construtores de pontes) para nosso próximo.


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Há algum tempo, organizei e editei uma antologia de citações reunindo frases sobre a Esperança e ainda as outras duas das chamadas virtudes teologais (principais) cristãs, o Amor e a . São ao todo 750 citações, e o livro, gratuito, pode ser baixado AQUI.


Alguns livros (gratuitos) que escrevi ou organizei podem ser baixados AQUI:

Um pouco de poesia experimental? Eu experimento AQUI.



Sammis Reachers, nascido por acaso em Niterói mas gonçalense desde sempre, é poeta, escritor e editor, autor de sete livros de poesia e dois de contos, e professor de Geografia no tempo que lhe resta – ou vice-versa.



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