São Gonçalo: santo ou beato? - por Erick Bernardes
Há aporrinhações que só acontecem comigo. Até parece invenção, principalmente porque a história ocorreu em um ambiente literário.
O caso se deu na noite em que fui convidado a falar de São Gonçalo na academia literária de uma cidade vizinha e, obviamente, dos meus livros de crônicas que narram histórias sobre o nosso município. Um certo padre, sob o título arcaico de Monsenhor, se aproximou de mim cochichando e sorrindo:
— São Gonçalo não era santo de jeito algum. Era só um padre que foi beatificado. Nunca foi santificado, se quer saber.
Pois é, isso ocorreu há uns dois anos, pelo menos, quando o referido Monsenhor "sei lá de quê" estava ali também para falar de literatura e resolveu me perturbar. É claro que eu sabia, tenho ciência que o clero não santificou o orago papa-goiabas, o santo São Gonçalo é reconhecido pela igreja apenas como beato. Contudo, há séculos vem sendo considerado santo pela população. E como dizem os próprios clérigos: voz populi vox Dei.
Arregacei as mangas como se fosse socar o Monsenhor — e falei alto, muito alto, o suficiente para fazer juntar ao menos meia dúzia de membros da tal academia de letras.
— Pois bem, o futuro São Gonçalo nasceu em 1200 (ou 1187) na região do Minho, em Portugal. De acordo com o livro do professor Rui Fernandes (p. 33, s/d), o padroeiro da nossa cidade era filho de família nobre e, aos sete anos, fora batizado, quando em seguida tomou as primeiras lições eclesiásticas no Arcebispado de Braga. Cresceu e se tornou pároco responsável pela Abadia de São Paio, exercendo competentemente seu trabalho. No entanto, padre Gonçalo partiu para suas peregrinações na Europa. Ele deixou o sobrinho na administração da paróquia, claro, necessário colocar alguém em seu lugar. Porém, uma traição aconteceu, o referido sobrinho usurpou o cargo de pároco pertencente a Gonçalo, roubou-lhe o emprego.
— Continue Erick, está interessante (pediu um dos acadêmicos)
— O certo é que mesmo tendo sido traído pelo sobrinho, Gonçalo não desistiu da fé. Entrou para a ordem dos freis dominicanos e realizou ainda em vida inúmeros milagres para os lados de Portugal. Nesse sentido, caro Monsenhor, como se sabe, a Igreja considera que todos são chamados à santidade e podem sê-los através das suas ações.
E assim a conversa se encerrou, apresentei os livros Cambadas aos membros da referida academia literária, e fim de papo.
Referência:
FERNANDES, Rui Aniceto Nascimento. Um santo nome: histórias de São Gonçalo de Amarante. São Gonçalo, RJ: São Gonçalo Letras, S/D.
Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.
