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A matilha fantasma - por Sammis Reachers


A partir de foto de Marcelo Kuhlmann/Arquivo pessoal
A partir de foto de Marcelo Kuhlmann/Arquivo pessoal

Sabia o nome dela das notas de entrega: Norma ou Dona Norma. Nunca conversávamos muito, – Boa noite, oi meu filho, é você, que bom, você é o mais simpático, aquele outro rapaz é meio grosso...


– Ele é gente boa, dona Norma, veio do interior, é mais assustado do que grosso... – Essa foi nossa maior conversa.


Um dia encontrei-a na rua Brás Cubas, próxima à Aclimação, a longos quilômetros de sua casa. Eu estava indo para meu turno na pizzaria, que ia das 15h00 às 23h30. Ela tentava apanhar um cãozinho que estava embaixo de um carro estacionado. Parei a moto e fiquei observando-a. Ela já idosa, tinha dificuldades. Desmontei para ajudá-la.


– Olá dona Norma! Quer ajuda aí? –, disse-lhe, já me agachando do outro lado do veículo e chamando o cachorrinho. Consegui apanhá-lo, era bem mansinho e magricela. Ela o colocou numa dessas caixas especiais para o transporte de pets.


Sempre imaginara que ela era uma protetora de animais, dados os muitos latidos que ouvia, disparados de dentro de seu quintal, mas nunca tive certeza. Perguntei:


– Este também é da senhora? Está longe de casa hein!


– Não, meu filho, este está abandonado. Eu sempre que posso recolho elezinhos e levo pra casa...



* * *

Depois daquele dia, passamos a conversar mais, e eu sempre perguntava pelos cães. Ela familiarizou-se ainda mais comigo, passou a relatar das dificuldades no trato dos exatos trinta e dois cães. Comecei a colaborar com a obra dela, uma vez por mês levava um saco de ração para de alguma maneira somar nas despesas. Nesses dias ela convidava-me para entrar, e passei a familiarizar-me também com os cães.


Era professora aposentada da USP. Tinha um filho apenas, funcionário de uma agência do Banco do Brasil nos EUA.


E assim nossa amizade foi estreitando-se, tanto entre mim e dona Norma, como com os cães.

Havia em sua casa um pátio coberto que servia de quintal, onde ela fizera pequenas celas de canil, de um lado e outro. Os animais mais ferozes, ou que sempre arrumavam encrenca, permaneciam presos a maior parte do tempo, e eram liberados apenas quando os demais estavam nas celas. Dentre eles, Drago, um pitbull que matara três cachorros e ainda ferira um homem que o tentara matar, e que ela salvou de ser posteriormente sacrificado; Lonlon, nome singelo para um dogue alemão especialmente hostil; e a cereja do bolo: Sem Matilha, um lobo Guará, com a aparência marcial, marcado de combates, que ela adotou quando o circo que o mantinha, impedido de continuar com animais selvagens devido a uma lei de 2005, foi obrigado a desfazer-se dos mesmos. O dono do circo, como ela gostava de dizer, 'espanhol morenão de Zaragoza', deveria doá-lo para um zoológico, como a maioria dos demais animais. Mas não apareceu zoológico algum interessado em apanhar o lobo, os dias foram passando e o dono do mesmo resolveu dá-lo para dona Norma. Com o tempo, já não me estranhavam, e passei a alimentá-los também.



* * *

Fui acordado pelos socos que ameaçavam derrubar minha porta. Levantei-me desnorteado, sonhava com a namorada que eu não tinha. Abri a porta.


– Você é Gabriel Motta?


– Sou eu, que foi, sou trabalhador – disse, entre assustado e intimidado pelo uniforme que vi.


– Houve um problema, um homicídio, tá, e a princípio você está sendo detido para averiguação.


Um soco velado na cara do crente, logo pela manhã. Um soco e depois um tiro como que por dentro: mataram dona Norma.


Silêncio na viatura, apenas relataram que uma vizinha havia dito que eu era a única pessoa que costumava visitar a casa. Foram até a Pizzaria Panosian e conseguiram o meu endereço.

Na delegacia o delegado pôs-me a par dos acontecimentos. Dona Norma foi encontrada morta num dos cantos de seu quintal, próxima ao muro dos fundos. Três cães também foram mortos. Dona Norma foi espancada e esfaqueada; os cães foram baleados. Um vizinho ouviu os disparos, por volta das quatro da manhã, e chamou a polícia.


Dei as explicações que me pediram. Não trabalhara no dia anterior, fui ao culto na igreja que costumava frequentar, saí de lá em torno de 22 horas, voltei para casa, fiz um lanche e dormi, talvez pelas 23 horas.


Após seis horas de perguntas, respostas e esperas, entrecortadas por telefonemas e comparecimento de amigos, vizinhos e testemunhas, consegui ser liberado. Perguntei ao delegado se poderia ir até o local do crime, eu poderia ajudar nas investigações. Ele a princípio recusou, mas com insistência consegui a autorização. Eu precisava ir até lá, precisava ver o que acontecera, ajudar no esclarecimento, ajudar os cães.


Ele me mandou junto a dois dos investigadores. Já ao entrarmos, os cães começaram a latir. Dois funcionários do centro de zoonoses da Prefeitura estiveram lá mais cedo, a pedido da polícia, e alimentaram com ração os cães. A maioria estava presa nas celas dos canis, mas alguns mais dóceis permaneceram soltos.


O cenário era terrível. Marcas de sangue ainda parcialmente úmidas no chão. Os policiais disseram que nada fora roubado. Mas por quê?


Havia outro fato sinistro. A cela do lobo, o Sem Matilha, apresentava quatro perfurações de bala no portão. No entanto, embora o formato da cela, bastante estreito e alongado, tornasse quase impossível que o animal não fosse atingido, ele estava em perfeito estado, aparentemente calmo, observando tudo com seus olhos escuros. O lobo não era de latir ou ganir; era um animal quieto e arisco, que na natureza não vive em bando, e se aproxima de outros lobos apenas para acasalar. Por que teriam disparado contra a cela?


Observando dentro da casa, lembrei de que a dona Norma detestava bancos; ela, filha de velhos anarquistas paulistas, oriundos da colônia Cecília, não confiava seja em governos seja em instituições financeiras. Ela guardava os recursos que seu filho lhe enviava dentro de casa. Será que os marginais sabiam disso, e queriam o dinheiro? Num momento em que os policiais verificavam as trancas da janela da sala da casa, fui até o quarto tendo em mente a ideia da existência de um cofre. Olhei todo o quarto, as coisas reviradas. Nada. Pelas marcas diferentes na pintura, notei que dois quadros da parede foram arrancados. Então estava claro que eles procuravam por um cofre. A um canto, sobre roupas íntimas aparentemente tiradas de uma cômoda, jazia uma estátua de um cão, um pastor alemão de cerâmica partido ao meio.


Algo então estalou em minha mente, e tudo pareceu ganhar simplicidade. Pois imediatamente visualizei a estátua que ficava logo junto à entrada, ao lado esquerdo da porta da casa. Uma escultura bastante feia, representando um cachorro de raça indefinível, feita de cimento, de uns oitenta centímetros de altura.


Não falei nada, nem cometi a temeridade de ir analisar a estátua em frente aos policiais. Eu era um motoboy habituado às noites efervescentes de São Paulo: conhecia a polícia bem demais para dar um mole desses.


Saímos. Mas a ideia de dinheiro ficar 'perdido' dentro de uma estátua, enquanto os cães eram recolhidos para o Centro de Zoonoses, para serem sacrificados caso não conseguissem adoção, não me deixava ter paz. Ela vivera para que eles vivessem: agora, morta, morreriam todos com ela? Não, com o dinheiro eu poderia providenciar um lugar para eles, até conseguir remanejá-los entre outras pessoas ou Ongs que os criariam sem o risco de serem sacrificados.


Mas o tempo era inimigo dos cães. Eu precisava encontrar o dinheiro antes do dia seguinte, quando eles começariam a remoção dos animais. E havia outra questão a me preocupar: segundo o delegado, o filho de dona Norma ainda não fora localizado nos EUA. Mas ele possuía residência e emprego fixos, e a localização era iminente. E, como ela sempre me relatava em tom de lamúria, ele, criado a maior parte da vida pelo pai, "detestava cachorros." Um com quem eu não poderia contar para nada.


À noite voltei à casa. Deixei a moto num posto de gasolina onde conhecia os frentistas, fui a pé até a casa, ladeando-a até a parte dos fundos, que dava para uma pequena mata. Com ajuda de um tronco, pulei o muro. Os cachorros soltos latiram, mas ao me reconhecerem fizeram festa, e alguns davam aqueles gemidos de tristeza, acredito que já sentindo a falta de sua mãe.


Distribuí a ração que ainda estava no depósito, soltei a maioria dos cães dóceis que conhecia. O lobo gania estranhamente, e resolvi soltá-lo também. Em seguida fui à estátua, apalpando-a de todos os lados. Sobre o pedestal de cimento, a estátua do cão moveu-se ao meu toque; estava solta. Levantei-a então, descobrindo sob ela um espaço escavado, e acondicionado ali uma caixa do tipo porta-joias, e embrulhos plásticos por baixo. Na caixa estavam dezenove mil e seiscentos reais, em notas de cem. Nas embalagens, documentos, postais, escrituras de terrenos, e papéis escritos em italiano, talvez de seus pais.


Já passava de uma da manhã. Não dormira desde a hora em que fora acordado pela polícia; resolvi deitar a um canto, no quintal mesmo, e dormir um pouco. Os cães, tristes e agitados, solicitavam-me a todo instante em busca de carinho, eu precisava ficar um pouco com eles. Escolhi um canto bem escuro, para o caso de alguma má eventualidade, como dormir demais e ser surpreendido pela polícia. Coloquei o despertador para as 4h30, para que eu pudesse pular o muro, e ir à polícia dizendo que eu ficaria responsável pelos cães, para o que eu, em secreto, utilizaria o dinheiro. Deus sabia que minha causa era justa, e eu sabia que dona Norma ficaria grata.


Havia o risco de tudo aquilo dar errado, eu ser novamente preso, pego com o dinheiro, e aí não teria desculpa ou álibi que me livrasse. Mas ao deitar-me, e ver mais de doze cães achegarem-se e deitarem sobre mim, ao meu lado, aos meus pés, eu sabia que valia a pena arriscar-me por eles. Eu era tudo que eles tinham.



* * *

Acordei com o som de disparos e ganidos. Era inacreditável o caos, e imediatamente pensei que se tratava de um pesadelo. Vi dois homens a alguns metros de mim, próximos à porta da casa. Um deles estava armado, e disparava contra o lobo. O lobo estava de costas para mim, e algo em sua face parecia brilhar intensamente, como se ele tivesse uma lanterna no rosto. O homem que empunhava a arma disparou entre cinco e seis tiros, e o animal não deu um pio, mesmo sendo balançado pelo impacto dos projéteis. Em ato contínuo, alguns cães fecharam um círculo sobre os homens. Os olhos dos animais brilhavam! Mas o que era aquilo?!? A luz que brilhava no lobo era a mesma incandescência que ardia nos olhos dos cães, mas em menor tom. Olhei para os lados, e vi outros cães, mas estavam amedrontados, e não havia brilho em seus olhos. Então, não sei como, talvez com a calma de achar que estava realmente tendo um simples pesadelo, com todo o nonsense e distopia que um pesadelo pode apresentar, foi que reparei que os homens estavam cercados apenas por cadelas, sete ou oito.


Enquanto refletia, o lobo uivou, e então senti uma pontada, uma cutucada no peito, no coração, não sei. As cadelas saltaram sobre o homem que tinha a pistola. O outro, apavorado, refugiara-se na casa, fechando imediatamente a porta.


O indivíduo armado disparou a esmo. Ao ferir uma das cadelas com o disparo, o até então invulnerável lobo gritara; outras três cadelas saltaram sobre as suas costas, e ao desequilibrar-se e cair sob o ataque, ele disparou mais uma vez, atingindo outro animal, fazendo mais uma vez o lobo gritar. Percebi logo que ele estava interligado aos outros animais, e parecia controla-los; seu domínio sobre eles era mais que um simples controle corporal, era um tipo de ligação empática, como se todos compusessem um único e carniceiro organismo, um tipo sobrenatural de matilha.


Imediatamente o lobo saltou, abarcando mais de três metros em seu voo, caindo direto sobre o peito do homem, e mordendo-lhe a garganta.


As fêmeas se afastaram e formaram um círculo em volta do lobo, seus olhos acesos, cada um brilhando numa cor. A maioria estava com as línguas para fora, como se estivessem cansadas, ou sedentas.


Eu não podia acreditar naquele horror, estava paralisado no chão, tentando entender que aquilo não era um sonho, mas precisava, tinha que ser. Então ele uivou novamente. E foi como um rasgo na escuridão – um rasgo revelando uma dimensão, um fundo, uma camada ainda mais escura. As cadelas começaram a chiar baixinho, com aquele som que os cães fazem quando feridos.


Meu corpo estava arrepiado por inteiro; eu usei a única arma que tinha. Num misto de súplica, terror e simples reflexo, eu gritei:


– Jesus!!!


Os cães deram um chiado agudo, mas o lobo apenas me observava com seus olhos acesos. A visão era insuportável: eu fechei meus olhos e em terror principiei a orar. Comecei em silêncio, mas depois vieram-me à mente em tumulto imagens e lembranças de cultos pentecostais, de demônios sendo exorcizados, e comecei a orar em voz alta. Abri então os olhos, mas sei que nunca deveria tê-lo feito: o lobo abaixara a cabeça e me olhava com uma expressão de dor quase humana, mas distorcida, doentia, algo que nunca vira nas muitas expressões que um cão ou qualquer animal podia assumir. Ele olhava para a casa e olhava para mim, em rápida e intermitente sucessão, num tique nervoso demoníaco. Então acreditei entender. O criminoso preso na casa, ele queria o criminoso. Ele queria que eu parasse a oração, ele precisava cuidar do outro.


E mais uma vez em minha vida, eu falhei como cristão. Eu interrompi meu clamor; num lapso de Queda, eu compreendi e irmanei-me ao desejo de vingança, ou de sangue, do demônio.


Fiquei de joelhos, observando os olhos faiscantes da besta-fera, que mais uma vez assumiu uma expressão humana, que me fez enregelar de uma forma que eu não saberia descrever, um tipo de frio absoluto que jamais experimentara, um entorpecimento, como se meu corpo tivesse sido envenenado.


Pois o lobo sorrira, humanamente sorrira. Em seguida emitiu um estranho som, algo como 'wain, wain', e deu meia-volta, arrancando em fúria e velocidade sobrenaturais em direção à porta da casa. As dobradiças explodiram ao impacto do magro corpo do lobo, e a porta foi abaixo com estrondo. O homem gritou. Da posição em que me encontrava não era possível ver bem o que acontecia, pois eu permanecia preso ao chão, enregelado. Ouvi um barulho de vidro quebrado, como de um copo ou alguma louça.


– Sai! Sai!!! – gritou o marginal. Novo barulho, e um outro. Ele atirava louças no animal. As cadelas entraram no recinto, de forma lenta e ordenada, como se em duas filas indianas, paralelas.


Ouvi novamente o som de comando do lobo, 'wain, wain'. O homem permanecia em silêncio, talvez também emudecido de estupefação pelo demoníaco espetáculo.


Depois gritou, quando todos os cães saltaram sobre seu corpo, de uma única vez. Ouvi então aquela multidão de rosnares e rugidos, como o som de uma briga entre muitos cães. O homem gritava um 'ahhh' prolongado e pânico, que parecia nunca ter fim, mas que foi abruptamente interrompido, como se alguém de repente lhe tapasse a boca, ou cortasse a garganta. Os rosnados continuaram. Os animais, possessos, rasgavam carnes, crimes, pecados, como uma chuva de retribuições que despencasse sub-repticiamente sobre um pecador, manifesta em dentes caninos incansáveis e olhos multicores, rebrilhando em mesmerizante compasso.


Fiz menção de levantar-me, ou levantar o que era corpo. Ele tremia. Levantei uma perna com dificuldade, depois a outra, sem equilíbrio, como que bêbado.


Só então arrependi-me, só então sobrescalei os ruídos do caos e dei ouvidos à voz do Espírito Santo que dentro de mim jamais parara de bradar:


– Não!!!


– Senhor, tenha misericórdia de minha alma, de meu frio! – gritei sem palavras.


Avancei com reerguida coragem, a coragem que a fé confere e também a ira, pois tinha agora a sensação de ter sido ludibriado, enganado pelo jogo sujo do demônio. À distância de oito ou nove passos, o lobo assomou à porta. Agora tinha a expressão impassível. Olhamo-nos nos olhos, e antes de eu retomar a oração em alta voz, ele disparou em direção ao muro, manifestando mais uma vez sua natureza demoníaca ao saltar sobre uma pequena casamata que abrigava a bomba d'água de uma cisterna, e dali, em velocidade felina, ultrapassar, num salto único, os restantes dois metros e meio de muro.


Imediatamente senti um alívio, uma sensação de descongelamento, estranha mas prazerosa, de ter sido devolvido ao comum, ao mundo real, ao mundo racionalmente mensurável e previsível.


As cadelas estavam ainda no quarto. Entrei para ver o que houvera com o homem. Umas lambiam despreocupadamente o sangue do chão, outras jaziam deitadas. Seus olhos já não estavam em fogo, a possessão cessara. Não havia corpo, pedaços. Nada além de manchas dispersas de sangue no chão.



* * *

Pesquisando em livros sobre mitos envolvendo o Lobo Guará, de referência em referência cheguei ao livro de Guilhermino Dutra, Fábulas e Mitos dos Povos Tupi-Guaranis, um livro prefaciado por Darcy Ribeiro. Nele, sofri mais um golpe do terror ao encontrar, na seção Fauna e Flora na Mistificação Tupi, a informação acerca de uma lenda dos índios Tamoios. Posteriormente comprei exemplar do livro. O relato é o que segue:


"Anhangá-Goa'rá, Lobo Fantasma. Do tupi agoa'rá, 'pelo de penugem', termo utilizado para designar o lobo-guará, e Anhangá, espírito que vaga, fantasma.


Também Kabikodepu-Ya'wara, Fera do Arco-íris. Do tupi Ya'wara, fera, e kabikodepu, arco-íris.


Mito coletado pelo indigenista francês Luc Guarirol. Segundo o relato, durante toda a estação de Ara ymã ou 'tempo velho' (equivalente aos nossos outono e inverno), alguns lobos-guarás se aproximavam das aldeias ou povoações, e enfeitiçavam todas as cadelas e quaisquer fêmeas de canídeos (cães do mato, guarás e falsas raposas, domesticados ou não) que ali houvesse. Elas fugiam então para a mata, e podiam ser vistas à noite, vagando atrás do lobo, com olhos coloridos e acesos como estrelas. O lobo não podia ser morto; ao ser atingido por flechas ou lanças, ele sempre reerguia-se, ainda mais furioso. A matilha vagava pela floresta, matando caçadores e pessoas que andassem sozinhas pelas matas."


Um dia fui contar meu testemunho em uma igreja. Antes da metade da história, fui bruscamente interrompido pelo pastor, que fez um gracejo sobre minha sanidade mental, levando toda a congregação a sorrir. Decidi nunca mais falar sobre os ocorridos a ninguém. Mas, não aguentando o peso de carregar sozinho uma história assim, resolvi escrever este relato, e divulgá-lo em sites e redes sociais. Sinto que é uma forma de confessar o meu pecado, uma forma de aquecer-me. Pois há dias, noites em que ainda sinto aquele frio.

Meu testemunho é verdadeiro.


Do livro O Pequeno Livro do Mortos (2015). Disponível na Amazon, aqui: https://www.amazon.com.br/Pequeno-Livro-dos-Mortos-Contos-ebook/dp/B073ZPV55S

Sammis Reachers, nascido por acaso em Niterói mas gonçalense desde sempre, é poeta, escritor e editor, autor de sete livros de poesia e dois de contos, e professor de Geografia no tempo que lhe resta – ou vice-versa.





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