São Gonçalo como objeto de colecionismo: Filumenia, por Rui A. Fernandes
Filumenia ou filumenismo é a prática do colecionismo associado ao fósforo: palitos de fósforos, caixa de fósforo, publicidade etc. O termo fósforo tem sua origem no grego phil e no latim lumen. Filumenia foi criado pela colecionadora britânica Marjorie S. Evans, em 1943, para denominar sua prática colecionista.
O palito de fósforo, ou fósforo de fricção, é um objeto curto, fino e feito de madeira, papelão ou barbante. É encerado e contém oxidantes, enxofre e cola em uma das extremidades. Esta, quando entra em atrito com a lixa, na parte externa da caixa, se decompõe e arde diante de baixas temperaturas. A lixa é fabricada com dextrina, fósforo e trissulfeto de antimônio.
O fósforo é um elemento químico que foi descoberto acidentalmente em 1669 por Henning Brandt, alquimista de Hamburgo, Alemanha, durante seus experimentos para obtenção de ouro a partir da urina. Em 1880, o físico inglês Robert Boyle criou uma folha de papel áspero com a presença de fósforo acompanhada de uma varinha com enxofre em cada uma das pontas. A fricção do palito com a superfície áspera fazia o fósforo liberar faíscas incendiando o enxofre. A popularização dos palitos de fósforo ocorreu em 1826, quando passaram a ter 8 centímetros de comprimento. Estes, no entanto, costumavam incendiar-se sozinhos na embalagem pelo atrito dos palitos. Esse problema só foi solucionado em 1855 com a criação dos “fósforos de segurança”, afixando-se um agente isolante e transferindo os elementos químicos para partes diferentes da embalagem. O fósforo passou a ser fixado na lixa externa das caixas. O palito de fósforo feito em papelão foi uma criação de Joshua Pusey, nos EUA, que os patenteou em 1889. Em 1897, a Companhia de Ópera Mendelsohn foi a primeira a utilizá-los como estratégia publicitária. Para abertura da temporada nova-iorquina distribuiu fósforos tendo o nome da companhia impresso.
No Brasil os fósforos de segurança passaram a ser fabricados pela Companhia Fiat Lux, em princípios do século XX. Em 1893 Vittorio Migliora e José Scarsi fundaram a primeira fábrica de fósforos do Brasil, que, em 04/07/1904, passou a ser denominada Companhia Fiat Lux, em São Paulo. Com o crescimento da empresa passou a adquirir outras empresas no Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraná e outros lugares. No estado do Rio de Janeiro, a Companhia se estabeleceu nos limites dos municípios de Niterói e de São Gonçalo, sediada na rua Padre Marcelino. Em parte de seu parque industrial, hoje, se localiza o hipermercado Carrefour, em Neves. Em 1940 era considerada uma das “maiores e funciona permanentemente resistindo aos monopólios e às crises, graças ao espírito empreendedor do seu principal dirigente o sr. João Dale”, segundo Luiz Palmier.
As caixas de fósforo eram utilizadas como estratégias publicitárias e distribuídos gratuitamente aos seus clientes. Estampavam-se a logomarca da empresa, imagens alusivas à uma data festiva. Havia também séries especiais registando paisagens, animais, símbolos do zodíaco ou artistas e esportistas. Muito disputadas foram as caixas que estampavam os retratos dos jogadores vencedores das Copas do Mundo das décadas de 1960 e 1970. Além das caixas de fósforo publicitárias havia as caixas utilizadas para consumo doméstico em formato similar aos usuais. O hobby se estendeu principalmente das décadas de 1960 a 1980. A introdução de caixas volumosas com pior qualidade de imagem, além da popularização do uso de isqueiros, fez com que esse hobby se perdesse com o tempo.
A prática da filumenia não se restringiu aos colecionadores privados. Tomar, em Portugal, possui o Museu dos Fósforos uma das principais coleções do mundo, que se originou de uma coleção pessoal e tem sido ampliado por doações de visitantes e apaixonados por esses itens. Será que eles têm as caixinhas produzidas em São Gonçalo?
Bibliografia:
Club Centroamericano de Filumenia – fósforos y cerillos. https://www.facebook.com/filumenia Acessado em 27/08/2020
Fiat Lux. In: https://origemdasmarcas.blogspot.com/2016/07/fiat-lux.html Acessado em 27/08/2020
Museu dos fósforos em Tomar tem a maior coleção da Europa. Cf: https://viagens.sapo.pt/viajar/viajar-portugal/artigos/museu-dos-fosforos-em-tomar-tem-a-maior-colecao-da-europa Acessado em 27/08/2020
PALMIER, Luiz. São Gonçalo, cinquentenário. História, geografia, estatística. Rio de Janeiro: Serviços Gráficos do IBGE, 1940.
FIGURA_1: Caixa de uso doméstico em madeira. S/d. Acervo pessoal.
FIGURA_2: Caixa de uso doméstico em madeira. S/d. Imagem da internet
FIGURA_3: Caixa publicitária da Cia Fia Lux. S/d. Acervo pessoal
FIGURA_4: Cartazetes publicitários da Cia Fiat Lux. S/d. Acervo pessoal
FIGURA 5: Companhia Fiat Lux em 1913. Do Almanaque do Correio da Manhã. Rio de Janeiro. 1913.
Rui Aniceto Fernandes é professor de História do Departamento de Ciências Humanas (DCH) da Faculdade de Formação de Professores (FFP-UERJ).