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Explodiu o número de jovens que vendem balas nas ruas de Alcântara, por Mário Lima Jr.


Foto: Filipe Aguiar/O São Gonçalo
Foto: Filipe Aguiar/O São Gonçalo

A quantidade de jovens, muitos menores de idade, vendendo balas nas ruas e nos sinais de trânsito da região de Alcântara atingiu níveis de vergonha, desespero e revolta. Pelo menos na percepção de um morador de São Gonçalo que circula em Alcântara quase todos os dias desde 1989. Visto que não existem estatísticas oficiais a respeito da questão. O governo de José Luiz Nanci não produz estudos sobre a realidade local, nem incentiva projetos capazes de atacar os problemas do município com inteligência.

O olhar desses jovens, o quanto eles estão focados, é algo bastante peculiar. Parecem dominados pela necessidade de abordar as pessoas, motoristas e pedestres, e vender uma mariola, bala ou amendoim. Quando questionados sobre as vendas, se vão bem ou mal, a maioria tem uma resposta padrão para voltar sua atenção ao próximo cliente o mais rápido possível. Habilidade desenvolvida pela vontade de sobreviver, professora mais eficiente do que qualquer coaching da moda.


Não raro o dinheiro que conquistam nas ruas ajuda no sustento de famílias inteiras, como mostrou a série Os Invisíveis, do jornal O São Gonçalo, publicada em novembro do ano passado. Geralmente vendedor ambulante não foi a primeira opção profissional e os jovens não estão satisfeitos com a própria condição, forçada pelo desemprego e pela crise financeira.


Em Alcântara, conversei com dois primos, João e Pedro, de 15 e 16 anos de idade, enquanto eles vendiam jujuba no estacionamento do supermercado Extra. O bairro onde moram é Trindade, mas o comércio forte e a grande circulação de pessoas em Alcântara atrai os adolescentes em busca de vendas melhores. Vendas que nem sempre acontecem. Na noite em que conversamos, um sábado, eles não tinham vendido o suficiente para comprar um pacote de fraldas descartáveis para o sobrinho de João, que estava a algumas dezenas de metros de nós. A irmã de João vendia mariola em outro ponto do bairro, segurando o filho bebê no colo.

Inclusive no comércio de rua de Alcântara, percebemos algumas diferenças assustadoras que acompanham a cor da pele dos vendedores ambulantes. Quanto mais negro for o jovem, é mais provável que a sua aparência indique cansaço, alienação, sofrimento e desconexão com a realidade, causada sobre possível uso de drogas. Antes de falar com João e Pedro, tentei contato com alguns jovens negros e eles se mostraram inacessíveis, monossilábicos. O Brasil é tão racista e preconceituoso que tenho dúvidas se é preciso lembrar que esse comportamento não tem nenhuma causa racial ou biológica. Alcântara prova algo triste. Até nas atividades menos valorizadas, entre brancos e negros são os negros que suportam o maior peso das decisões que atrasam o desenvolvimento e a igualdade social no país desde o ano de 1500.

Os jovens que vendem balas em Alcântara dizem que frequentam a escola e acredito que estão dizendo a verdade. No período de férias escolares, que terminou no início do mês, a quantidade de vendedores nas ruas nos dias úteis era bem maior. Nos fins de semana, o número de vendedores aumenta e um dos adolescentes que vendem mariola no sinal de trânsito ao lado do valão do Vila Três, bairro vizinho de Alcântara, é sempre o mesmo, carregando de lado a sua pochete com o escudo do Flamengo.


Esse é um caminho de esperança, a escola pode implementar projetos de profissionalização que tirem os jovens gonçalenses das ruas. O setor de tecnologia, por exemplo, é o maior motor de desenvolvimento econômico no mundo inteiro. E São Gonçalo é um gigantesco polo exportador de mão de obra de tecnologia no Estado do Rio de Janeiro.

Mário Lima Jr. é escritor.




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