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Gonçalo Gonçalves sob o olhar contemporâneo - por Erick Bernardes


Foto: Álvaro Teixeira Filho. Roteiro cartográfico da Baía de Guanabara e cidade do Rio de Janeiro, século XVI e XVII. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1975. Coleção Histórica e Cultural do Rio de Janeiro, vol. 1, p. 9. ...
Foto: Álvaro Teixeira Filho. Roteiro cartográfico da Baía de Guanabara e cidade do Rio de Janeiro, século XVI e XVII. Rio de Janeiro: Livraria São José, 1975. Coleção Histórica e Cultural do Rio de Janeiro, vol. 1, p. 9. ...

Difícil ao escritor é obter a compreensão correta do gênero crônica. Isso se deve às misturas de estilos e modos de escrever que a tornam talvez um dos textos mais flexíveis de se produzir. Tendo isso em mente, e diante da necessidade de esclarecer algumas perguntas formuladas por leitores e enviadas por whatsapp, pensei: por que não misturar a veia cronística à resenha de um dos melhores livros produzidos recentemente sobre a história gonçalense? Pois bem, desafio lançado.


Uma das dúvidas comuns aos estudiosos da história do Leste Fluminense tem sido a questão: onde teria surgido de verdade a sesmaria (futura cidade) de São Gonçalo? Uma querela e tanto a qual atraiu atenção de especialistas mais recentes cujos esforços vêm dando ótimos frutos com relação às pesquisas acerca do território papa-goiaba.


Durante um longo tempo se pensou ter existido uma construção — por ordem do sesmeiro Gonçalo Gonçalves — de certa capela inaugural às margens do rio Guaxindiba, para os lados do que é hoje o bairro de mesmo nome. Essa referida construção rústica seria o começo de tudo no município, sua gênese, o pontapé existencial gonçalense. Porém, estudos mais atuais dão conta de que a fundação de SG ocorreu onde é hoje a Igreja Matriz católica do município. Exato, existiram dois Gonçalos Gonçalves, um apelidado de “O velho” e o outro de “O novo”. Daí terem aparecido certas escorregadelas interpretativas acerca da história local. Isso mesmo, nada de haver "pedra fundamental" longe do centro, a igreja pioneira lançou seus alicerces às margens do Rio Imboaçu mesmo, pelo mais velho dos Gonçalos, simples assim.


O investigador interessado na histórica do Sertão Guanabarino tem à disposição inúmeros trabalhos de estudiosos de respeito sobre o assunto. Nomes como Monsenhor Pizarro, Luiz Palmier, Salvador da Mata e Silva, Evadyr Molina, Oswaldo Luiz, Homero Guião, Roberto Barros, Maria Nelma Braga e Rui Aniceto Fernandes, são exemplos desses pesquisadores que falam das Bandas d'além e cercanias. Contudo, recentemente nos chega às mãos o livro Um ilustre desconhecido (2020), do professor Rui Aniceto Fernandes, o qual contém informações resultantes de pesquisas atualizadas que desmistificam equívocos e lançam novas luzes sobre a cidade do Beato Gonçalo. De acordo com Rui: “As polêmicas em torno do fundador e do local da fundação de São Gonçalo envolveram a historiografia local entre os séculos XIX e XX. O revisionismo, identificado a partir dos trabalhos de Roberto Barros, relaciona-se com os processos vivenciados pela localidade” (FERNANDES, 2020, p. 57), e isso decerto esclarece muita coisa acerca dos primórdios do município e fomenta nos moradores o prazer de conhecer a própria cidade.


O poeta Zé Salvador se debruçou sobre a pesquisa de Rui Fernandes, verteu para os versos de cordel e exemplifica muito bem a importância desse trabalho de pesquisa de um personagem fundador que:


Nas cadeiras da escola

Não tem lugar merecido,

Não aparece na grade,

O ilustre desconhecido;

Por assuntos estrangeiros,

Ele é sempre preterido.

(...)

A cidade, por bom tempo,

Sofre de um preconceito

O próprio filho da terra

Tem por ela um rejeito

Tem vergonha de dizer

Que mora aqui o sujeito

(SALVADOR, 2020, p. 8-11).


Em síntese, a obra de Rui faz uma revisão bibliográfica, confronta escritos históricos anteriores, pontua lacunas e possibilidades de novas interpretações, oferecendo ao leitor resultados das próprias investigações. Além disso, contém nomes dos descendentes do sesmeiro Gonçalo e apresenta transcrições de documentos importantíssimos como procurações e cartas vinculadas à fundação de SG. É de fato um trabalho de excelência, indiscutivelmente. Se eu fosse você, iria correndo ler esse interessante material.


Referência:

FERNANDES, Rui Aniceto Nascimento. Um ilustre desconhecido: Gonçalo Gonçalves, os processos de colonização lusa nas terras guanabarinas e identidade local. Cabo Frio, RJ: Editora Visão, 2020.


SALVADOR, Zé. Na pista de um ilustre desconhecido. São Gonçalo: RJ, edição do autor, 2020.

 

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Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.





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