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Chumbo trocado

SÃO GONÇALO DE AFETOS


Por Paulinho Freitas

Foto: Reprodução
Foto: Reprodução

Lenita era apaixonada por Virgílio, desde sempre. Ele, o único que tocou seus lábios, que a fez desmaiar ao primeiro beijo, era dono de seu corpo, sua alma e coração. Embora desprovido de beleza física, era o amante perfeito e também um predador feroz, tratava as meninas de nossa época como caça, nunca teve uma assinatura na carteira de trabalho e vivia nas costas da mãe. 


Quando anunciaram o casamento, a mãe de Virgílio, chamou Lenita num canto e avisou:


_ Você tem certeza de que quer se casar com este traste? É meu filho, mas não vale um centavo. Não gosta de trabalho, é mulherengo e farrista, não sei a quem puxou, é um zero a esquerda. Eu aturo porque é meu filho, você não tem essa necessidade. 


Lenita, resiliente respondeu:


_Eu não gosto do seu filho. Sou doente por ele e morro por ele, se preciso for. 


A mãe de Virgílio lavou as mãos:


_ “Quem compra sem ver, tem vontade de ser cego.” 


A vida de casados seguiu o roteiro que a mãe de Virgílio previu. Ele esperava Lenita dormir, cansada de longas horas no trabalho, se perfumava e caía  na farra e jogatina até altas horas. Saia e voltava na ponta dos pés, silencioso como um felino, ela nem percebia que ele havia saído. 


Um dia Lenita sentiu-se mal no trabalho e chegou mais cedo em casa. Para seu espanto, na sua cama, no lugar que ela saboreava e era saboreada, consumia e era consumida por um amor insano, outra mulher dormia, seminua, com as roupas espalhadas pelo chão do quarto. Quando Virgílio entrou no quarto, com uma garrafa de espumante nas mãos e duas taças, deu de cara com Lenita parada, em choque com a cena que presenciava, atônito, contou a história que lhe veio à cabeça:


_ Amor, essa moça vinha passando aqui na rua, quando eu fui colocar o lixo lá fora, ela caiu desmaiada. Não tive outra alternativa, se não, trazê-la para dentro, para cuidar dela. Só que quando ela entrou no quarto, foi possuída por uma entidade e começou a gargalhar e tirar a roupa, pulou em cima de mim, me jogou na cama e tentou me possuir. Só que eu fui muito ágil, consegui sair de cima dela, convencendo-a a aceitar cigarros e bebidas, nenhuma entidade recusa isso. Aí, quando voltei, você estava aqui, acho que a entidade “subiu” e deixou a moça desacordada. 


Lenita era só amor e perdão. Religiosa e apaixonada, mas que de burra não tinha nada, fingiu acreditar para salvar seu casamento. A vida voltou a normalidade e Virgílio se transformou no melhor dos maridos. 


Exatos três meses depois, Virgílio volta ao estado original de fábrica e de novo, começa  ele a aprontar das suas. 


Numa tarde de sábado, ao retornar de uma suposta partida de futebol e churrasco com os amigos da igreja, Virgílio viu, talvez, a cena que, se na bíblia fosse narrada, o teria transformado numa estátua de sal: Um cara de mais ou menos 1,90m de altura, por dois de largura, completamente nú, em cima de sua “frágil” Lenita. Furioso, deu um grito de pavor, mas, de tão assustado, não conseguiu ter qualquer reação. O homem deu um pulo da cama e colou as costas na parede, com um travesseiro cobrindo suas partes íntimas. Lenita, com a calma de uma freira enclausurada, mas só de calcinha, explicou:


_Meu amor, eu chamei o meu amigo de trabalho para me ajudar a fechar o balanço, que está com uma diferença que eu não consigo achar. Quando ele chegou, foi possuído por um espirito demoníaco, arrancou minhas roupas e se jogou em cima de mim. Na hora, ainda ofereci bebidas e cigarros, lutei com todas as minhas forças, mas..., sair de baixo é mais difícil. Ainda bem que você chegou. 


Lenita se jogou nos braços de um atônito Virgílio, que nada conseguiu fazer, a não ser abraçar a mulher, que fingia chorar, mas com rosto escondido, sorria cinicamente, saboreando a cítrica vingança, e, afagar seus cabelos, enquanto o outro pegava as vestes e saía de fininho. 


É Virgílio, deu ruim. 

 

Obs: Qualquer semelhança com fatos, nomes e pessoas, é mera coincidência. 


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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor 

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