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Há uma fonte de esperança na Praça do Bandeirante - por Mário Lima Jr.


Foto: Filipe Aguiar
Foto: Filipe Aguiar

Gonçalenses de todos os cantos precisam ver esse fenômeno. Surge uma fonte de esperança na Praça do Bandeirante, no bairro Amendoeira, quando ela enche de crianças. Dá pra sentir a presença de algo sobrenatural no ambiente só de passar em frente à praça.


Extremamente rara, a manifestação não acontece em outras praças de São Gonçalo. Na do Bandeirante ela é evidente. O ar tremendo cede lugar à fonte quando ela começa a ocupar seu espaço. O barulho dos veículos e das lojas funcionando e as palavras ditas no local se tornam mais gentis, como o grito de uma mãe que da janela chama os filhos com paciência.


Dessa fonte não sai água, nasce a vontade de continuar acreditando em São Gonçalo. Graças a sorrisos infantis que não são encontrados em nenhum outro lugar do mundo. Vindos das crianças da Alma e do Miriambi que deixam os complexos pra brincar na praça e conseguem esquecer, por alguns minutos, a tristeza da pobreza e da violência em que vivem.


Em outros pontos da cidade, até mais violentos, os pequenos moradores se divertem mas não esquecem. Como não lembrar dos homens mascarados que invadem o Salgueiro à noite, portando fuzil com mira a laser, atirando em tudo o que se move, inclusive sapateiros e padeiros que trabalham na favela? Pelo menos na Praça do Bandeirante a expressão de alegria infinita no rosto dos meninos e meninas indica que o esquecimento é uma virtude.



Se cada gonçalense puder visitar a praça num fim de tarde, com as crianças correndo pra lá e pra cá, subindo e descendo do escorrego, caindo no chão de propósito, algumas no balanço ainda vestindo uniforme escolar, depois de convencerem seus responsáveis a parar “só um pouquinho” no caminho de volta pra casa, abraçando e beijando outras crianças enquanto o sol enfraquece e os adultos batem papo, o riso fica mais alto e as crianças chamam umas às outras pelo nome, e o nome daquelas que começaram a frequentar a praça recentemente é conhecido e gritado também, com a maior intimidade do mundo, como numa amizade antiga, e carrinhos de bebê se aproximam sem babás, sem abismos sociais, crianças de todas as cores, se cada gonçalense visse isso, a cidade inteira descansaria também.


Não se trata de ignorar as barricadas, os jovens sem trabalhar, sem estudar, escravizados pelo crime e pelas drogas. Ou desconsiderar homens brancos que matam negros a sangue frio e a polícia prendendo negros em motocicletas sem placa porque o DETRAN de Adolfo Konder, homem branco, não foi capaz de pendurar a identificação do veículo. A fonte não provoca alienação ou torpor. Ela corrige o equívoco de achar que São Gonçalo não tem força suficiente pra vencer suas dificuldades.

 

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Mário Lima Jr. é escritor.




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