Mutondo e outras possibilidades, por Erick Bernardes
No mundo normal de hoje, aquele que por convenção e por contraste chamamos de civilizado e conhecido, quase nunca nos damos conta de questões vocabulares enraizadas nos topônimos gonçalenses — e não raro nos deparamos com uma ou outra versão sobre a origem do nome de algum bairro por aí. Com o Mutondo não foi diferente, a possível motivação tem origem no instrumento de percussão mutondo e já foi tema de outra crônica nossa depois de muitos questionamentos.
Mas o bom da vida — ou simples desculpa do narrador — é que outras teorias surgem. Novas possibilidades se abrem. E o que outrora constituía uma coisa se transmuta em outra mais conveniente. Quer saber? Pois bem, é que Mutondo também é nome de rio, e nome de árvore. Ou seja, parece que a árvore mutondo nomeou o rio que, por sua vez, o rio nomeou o bairro.
De acordo com o artigo da ACTD (Artigo Científico Tropical), a árvore originária de Moçambique de nome mutondo fornece “madeira de cor castanho-clara com traços castanho-escuro. Boa de envernizar e polir. Pequena tendência para abrir fendas quando em toro, mas deteriora-se facilmente quando exposta ao tempo” (2013, s/p). Não seria ela responsável por fornecer madeira para confecção de instrumento de percussão de origem africana de mesmo nome usado no Brasil colonial? Provável que sim, principalmente, se essa madeira fosse plantada nas margens do rio homônimo que corta hoje o referido bairro.
Já no caso do rio Mutondo, ele faz parte da bacia hidrográfica do rio Alcântara e exerceu papel importante no abastecimento hídrico da região. Sendo assim, se lá nas terras moçambicanas o vegetal recebera também outras inúmeras designações: Naculuvé; Rondo; Rôndué; Tôndué; Intondo; Morrondo; Morrondue; Morrongué; Moroando; Murroto; Bonjua; Boboti; Moanjwa; Manga-brava; Merrôto, bem provável que a palavra mutondo tenha criado raízes por aqui e suas plantas servido de área verde ao longo dos rios gonçalenses. Uma pena não haver certezas, melhor mesmo é especular.
Fonte:
https://actd.iict.pt/view/actd:XYLD0119
Fonte da foto
http://pza.sanbi.org/cordyla-africana
Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.
