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Uma instituição integral

Por Hélida Gmeiner Matta


Foto: Divulgação internet
Foto: Divulgação internet

A tragédia ocorrida em uma creche municipal de Petrópolis, cujos desdobramentos foi levado ao ar no Fantástico de domingo passado, reacende uma recorrente questão. Que instituição é essa que, um dia criada para ampliar acesso ao conhecimento, cada dia mais se vê na ponta do desenvolvimento do indivíduo?


Assistir à reportagem, sendo educadora e portanto me "vendo na pele" da equipe da unidade, foi um exercício angustiante. Foi, mais uma vez em uma rede social, o Facebook, que consegui elaborar as sensações e os sentimentos.


A autora da publicação , que você pode ver logo abaixo, é professora na mesma rede municipal em que atuo. Ela foi precisa.



O delegado responsável, que segundo a matéria no Fantástico, "resolveu investigar" concluiu pela negligência da equipe da escola. E as educadoras, que na reportagem claramente estavam empenhadas em salvar a criança, foram indiciadas por homicídio culposo. Homicidas em pleno exercício da sua formação!


Desde 2019, uma lei determina que haja um profissional habilitado em primeiros socorros. A creche é municipal. Quem foi indiciado por não haver tal profissional no momento? Quem foi indiciado pelo homicídio, nesse caso, inclusive , doloso, por assumir o risco de não oferecer, não habilitar e não fiscalizar o cumprimento da lei?


A perda dessa família é irreparável e isso não está em questão. O que está em questão é a gestão da educação básica brasileira. Cujas leis mais elementares estão à espera de cumprimento por motivos econômicos. Muitas vezes por verbas desviadas ou "enxugadas" por governos.


Trabalhamos, eu e a autora da publicação, na rede de educação de um dos mais ricos e bem estruturados municípios do RJ. No entanto, desconheço alguma unidade escolar que tenha um profissional habilitado em primeiros socorros. Se uma criança se engasgar e não soubermos socorrê-la, estamos passíveis de acusação de homicídio?! Nós?! Não deveria ser quem não garantiu a presença de tal profissional?




Peço desculpas por um artigo repleto de perguntas e questionamentos, mas a angústia de querer permanecer numa instituição onde o exercício do ensino pode me levar a uma acusação de homicídio, pela incapacidade de realizar uma tarefa que não foi devidamente ensinada, me deixa perplexa demais para ser propositiva.


E cada dia mais, me convenço de que é preciso ampliar o espectro da atuação educacional, incorporando ao nosso universo, instituições, profissionais e saberes outros. Já dependemos de nutricionistas e cozinheiras. Um dia, muitos anos atrás, já contamos com dentistas e psicólogos.


Muitos professores e professoras não concordam com essa ampliação, acreditando que seria uma incorporação inadequada. Têm certa razão, mas diante de uma realidade como a que estamos diante - imagine o absurdo de seremos acusados de homicídio por não sabermos prestar primeiros socorros - considero que seja importante ponderar sobre essa questão.


Se à escola tudo deve caber, que a ela tudo se dê.

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Hélida Gmeiner Matta é professora da Educação Básica da rede pública. Pedagoga, Especialista em alfabetização dos alunos das classes populares, Mestre em Educação em Processos Formativos e Desigualdades Sociais e membra do Coletivo ELA – Educação Liberdade para Aprender.


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1 comentário


Marilyn Pires
09 de jul. de 2022

Concordo com você e, inclusive uso dos mesmos questionamentos. Se nós não podemos dar Novalgina em gotas para o aluno porque não temos formação, como pretendem que sejamos socorristas? Eu sinceramente não entendo. A escola é um espaço onde as crianças passam boa parte do dia, portanto concordo que deveríamos contar com outros profissionais, mas não acho justo que nos deleguem mais responsabilidades. Mesmo que tivéssemos um profissional em cada escola habilitado em primeiros socorros, ainda seria pouco.

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