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O Castigo - por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS

Foto: Pixabay
Foto: Pixabay

Manilha, bairro em que São Gonçalo do Amarante faz divisa com Itaboraí, abrigava uma imensa comunidade cigana. Vivia esta comunidade da compra e venda de toda a sorte de coisas, os homens e as mulheres de ler a sorte das pessoas e realizar simpatias para desfazer todos os males e curar doenças. Nos dias de festa vinham outras famílias ciganas para confraternizar, com vestimentas coloridas, pescoços, braços e tornozelos repletos de joias e os belos rostos encantando a todos. Os cânticos e as danças iam até o amanhecer.


Naquele ano, no dia de Santa Sara protetora dos ciganos, uma grande festa foi organizada, todos dançavam e cantavam, comida e bebida farta. Isis, uma das mais belas jovens daquela comunidade, dançava fazendo os jovens ciganos sonharem acordados. O olhar de Isis só tinha uma direção. Fora do acampamento, escondido entre as árvores, o jovem Thiago estava embebecido com a beleza da amada. O único problema é que cigano só pode casar com cigano, se houver desobediência o preço a pagar é alto.


Thiago e Isis fugiram antes do amanhecer. A falta da menina só foi dada quando na hora do preparo da refeição a foram procurar para o auxílio na cozinha. Imediatamente uma comitiva saiu à procura da menina que não foi encontrada e então souberam da fuga. O pai a amaldiçoou e jurou vingança ao casal até o fim de suas vidas.



Dez longos anos passaram. Os ciganos, depois de andarem o Brasil inteiro, voltaram a montar seu acampamento em Manilha e descobriram que Isis e Thiago ainda estavam em São Gonçalo e viviam no Bairro do Pontal, entre Gradim e Porto Velho, numa casa cheia de gerânios e rosas que misteriosamente ardeu em chamas numa madrugada fria de maio. Tudo virou cinzas.


Naquele mesmo mês, no dia vinte e quatro, uma grande festa em homenagem a Santa Sara foi organizada pelos ciganos e no meio de tanta alegria o pai de Isis bebia e chorava o triste destino da filha. Talvez arrependido da pretensa vingança não realizada por ele, as que o destino tratou de cobrar.


Longe dali, em Cachoeiras de Macacu, Isis e Thiago estavam seguros, todos acreditavam que haviam morrido no incêndio e não haveriam de perturbá-los nunca mais.


Isis acendeu no altar, na sala da casa, uma vela para Santa Sara, Thiago abriu uma garrafa de vinho suave. Com frutas sobre a mesa, uma flor no cabelo e castanholas nas mãos os dois cantaram e dançaram em homenagem a Santa e foram dormir o sono do amor, verdadeiro, justo e merecido.


Misteriosamente não despertaram, a perícia atestou causa mortis desconhecida sem grandes investigações.


Na manhã seguinte ao acontecido, depois dos festejos os ciganos desmontaram o acampamento e se foram. O terreno jamais foi ocupado novamente.


A lei cigana tem as mãos pesadas e os olhos bem abertos, sem vendas.


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Obs: Qualquer semelhança com nomes ou fatos reais é mera coincidência.


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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.






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