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São Gonçalo, o “patinho feio” da região metropolitana, está cansada



São Gonçalo é uma cidade complexa e muito difícil de administrar por dois motivos muito simples: ela é populosa e pobre. A renda per capita (anual) da população em relação ao orçamento da cidade é de míseros R$ 972,00. Para ficarmos com o exemplo da cidade do Arariboia, Niterói possui uma renda per capita de R$ 3.483. Por conta disso, São Gonçalo segura a lanterninha da colocação entre os 92 municípios fluminenses.

A receita tributária do município que compõe a fatia do orçamento anual de R$ 1,2 bilhão, é de 21,7%, enquanto em Niterói é quase o dobro, 39,3%, de um orçamento que este ano ultrapassou os 2 bilhões de reais. O IPTU em São Gonçalo, com pouco mais de 1,1 milhão de pessoas, corresponde a 5% do que é arrecadado, enquanto em Niterói, com 498 mil habitantes, este percentual é de 13% do total das receitas próprias que entram nos cofres da prefeitura.

Comparar duas cidades com realidades socioeconômicas tão discrepantes pode turvar a compreensão do seu desenvolvimento histórico. Niterói, por exemplo, foi capital do antigo estado do Rio de Janeiro, e herdou todo o seu corpo técnico-burocrático, saído principalmente dos quadros da Universidade Federal Fluminense (UFF), formador da pujante classe média atual da cidade. Já São Gonçalo, que abrigara as maiores indústrias da região até a década de 1980, foi esvaziada economicamente e até hoje bate cabeça para achar o seu caminho, e está cansada.


Dados extraídos do Anuário das Finanças dos Municípios Fluminenses (2015) e de Deepask.com

O jornalista, cientista social e editor-chefe do Jornal Daki, Helcio Albano, explica que São Gonçalo não cresceu, inchou à revelia do poder público que jamais ousou fazer um planejamento sério para o seu desenvolvimento ao longo de todos esses anos:

-Eu costumo brincar dizendo que São Gonçalo foi sem nunca ter sido. Há uma tradição oral ufanista da grande Manchester Fluminense industrial, mas a verdade é que essas indústrias seguiam a lógica capitalista de acumulação e de remessas de lucro maciças para as suas matrizes no exterior, deixando pouco ou nada por aqui. Esse mito, pelo contrário, só nos atrapalhou criando uma das nossas maiores mazelas, que foi a ocupação desordenada do solo por uma outra indústria, a dos loteamentos, sejam eles oficiais ou os informais, estimulados principalmente por políticos - muitos deles loteadores - e pela vista grossa da prefeitura. Isso explica o inchaço da cidade e esse problema crônico, por exemplo, da baixa arrecadação de IPTU até hoje - observou Albano.

São Gonçalo foi uma das cidades brasileiras com maior crescimento populacional nos últimos 40 anos, devido principalmente à sua política fundiária. O jornalista assinala que o município foi e é atraente devido à sua localização geográfica e ao baixo, ou custo nenhum do solo, por conta da omissão histórica da prefeitura, que jamais arbitrou seriamente sobre o assunto. Na década de 1990 o prefeito Edson Ezequiel tentou solucionar o problema da baixa arrecadação do IPTU atualizando o cadastro de imóveis e de contribuintes da prefeitura. Mas foi tanto um equívoco técnico quanto uma tragédia política.

- Fazer medição de imóveis para fins de cálculos tributários é um troço caro porque é muitíssimo trabalhoso. Ele (Ezequiel), então, optou fazer a medição aérea com base em fotografias e foi um desastre. De um ano para o outro várias pessoas começaram a receber mais de um carnê, quando na verdade o que o sujeito tinha no quintal não era mais uma casa, mas um simples galinheiro. O resultado foi uma grita geral, Ezequiel perdeu a eleição e o caso entrou para o anedotário gonçalense. Hoje, mesmo tendo o Google Earth, ninguém se atreve a mexer nesse vespeiro, mas um dia isso terá que ser encarado de frente”, lembrou Albano.

DESAFIOS PARA O FUTURO

Qualquer um dos candidatos que vier a ser o prefeito sabe que São Gonçalo vive uma série de restrições orçamentárias para o tamanho da população. Para Helcio Albano não existe solução milagrosa, mas ela passa pelo amor à cidade, conhecimento de causa, criatividade e coragem:

- Num primeiro momento não há muito o que fazer a não ser manter e aperfeiçoar o que já existe. Temos um número razoável de unidades de saúde e de escolas que precisam funcionar de verdade, além de uma rede de assistência que, se for integrada, dá conta do recado. O futuro prefeito precisa ter a coragem de por fim à política de cargos comissionados como moeda de troca política e valorizar os servidores já existentes, além de trazer quadros que pensem a cidade a médio prazo e tenham capacidade de criar e executar projetos com dinheiro captado de fora, principalmente da União.

É preciso criar empresas públicas, como por exemplo a de Lixo, para gerar emprego e renda dentro do conceito de reciclagem. O prefeito tem que tomar para si a responsabilidade de conduzir um plano diretor de transportes a sério. A população vive refém de três famílias que controlam todo o transporte público da cidade. São atitudes simples e corajosas com uma pitada de criatividade para tirar a nossa condição de patinho feio. Mas para isso deve existir amor por essa cidade; se não, nada feito - salientou.

São Gonçalo vive uma delicada dependência de recursos do governo federal, estadual e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) que correspondem em mais de 70% do seu orçamento anual que, ainda assim, são mal aproveitados:

- Os últimos prefeitos foram ao mesmo tempo incompetentes e perdulários. Primeiro porque foram incapazes de criar um modelo de gestão calcado na realidade financeira do município, segundo por gastarem mal o dinheiro repassado, sem nenhum tipo de planejamento, isso quando o dinheiro não voltava por falta de projetos executivos da própria prefeitura. A ordem aqui é empurrar a administração com a barriga com eterna submissão aos políticos do Rio. Isso tem que acabar - concluiu Albano.

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