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Tristeza - por Paulinho Freitas

SÃO GONÇALO DE AFETOS


Foto: Pixabay
Foto: Pixabay

Em mais um plantão de vinte e quatro horas, fiquei olhando o céu, as estrelas e a lua. Ninguém passava na rua, o ar era quente. Da varanda onde eu estava pensava: Por quê eu sou tão adverso e porquê tanta gente não gosta de texto comungado em verso? Sei lá! Não achei explicação. Fiquei ali, olhando para todas as coisas, com o peito apertado, pensando nas pessoas que vão se fechando em conchas, nesses tempos em que tudo é permitido e querem se proibir, até da cama sair, por conta da tal de Tristeza. Ela é tão poderosa que não tem dinheiro e nem posição social que sejam perdoados, ela ataca, bate, esfola, faz morrer e permanecer vivo, sem ser zumbi. Troço doido! A gente quer se esconder do mundo, mas não dá. Vejo na parede uma mosca, tranquila, sorvendo um pouco de alguma coisa lá grudada, ela, só quer ficar ali. Parada.

Perto dela, vejo uma aranha pronta para abocanhá-la. Não muito distante, uma lagartixa observa atenta. A mosca saboreia o que está na parede, a aranha come a mosca e a lagartixa abocanha os três. O predador venceu.


No mar, uma ostra está fechada, nem sabe que naquela madrugada eu estou ali, como ela, fechado e querendo que meu mundo seja só eu e minha solidão. Não quero vida, mas também não quero morrer. Quero paz. A paz que só se encontra no vazio do meu próprio mundo. Ela precisa se alimentar, se abre para capturar nutrientes trazidos pelas marés. Coitada! Um peixe vem, devora suas entranhas e sai nadando, satisfeito e feliz, abanando o rabo, tremelicando as barbatanas.



A gula, sexto pecado mortal está à espreita. Ao invés de descansar depois da refeição, o peixe cisma de arrematar um saboroso camarão que se insinua à sua frente. Dentro do camarão um anzol, que adentra ao céu de sua boca num repente. Tira sua estrela da vida, lhe entrega a morte de presente. O predador vence.


Começa o amanhecer. Um passarinho come a lagartixa, o gavião vem, de mansinho e consome o passarinho, o cantar tão belo emudeceu. O predador venceu.


Por entre árvores e casas, o sol começa a anunciar uma nova experiência de vida. Um gato preguiçoso, que dormia em cima de um muro é acordado por uma legião de vira latas o querendo pegar. Rápido como um raio ele salta, ganha um telhado e desaparece no ar. Este, consegue escapar.

As pessoas começam a passar apressadas para pegar a primeira condução da manhã. Em seguida, crianças barulhentas a caminho da escola, donas de casa indo às compras, catadores de recicláveis, vendedores de toda a sorte de coisas, boêmios contemporâneos chegando de sapatos nas mãos, andando em zigue-zagues, comerciantes abrindo as portas, o destino da gente se abrindo como comportas de inúmeras possibilidades. A sola dos meus pés se energizando, o corpo todo pulsando, vou entrando em erupção, explodindo, jorrando vontade e vida como lavas de um vulcão. Dou uma espreguiçada, com a ponta do dedo do meio apontada, grito de boca arreganhada: ALÔ TRISTEZA! COMIGO NÃO! QUEM MANDA EM MIM, SOU EU!


O predador perdeu!


E assim termino mais um plantão.


Vivas à vida! Vivas a cada instante!


Vivas à meu São Gonçalo de Afetos!


Vivas à meu São Gonçalo do Amarantes! 133 anos de emancipação.


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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor.


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