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Os Sacis sacanas da Ilha de Itaoca, por Erick Bernardes


Imagem: https://i.pinimg.com/originals/19/ed/b9/19edb9ef7b5c0996a7322cc60715fd7e.jpg
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Essa história aconteceu em fevereiro, último dia de carnaval, quando Tinguá e seus amigos davam continuidade à tradição de se sujarem todos de lama do manguezal no intuito de brincarem nos blocos da região. Contudo, o caso se passou muitíssimo assustador, pois o irmão do nosso amigo caranguejeiro desapareceu.


— Mas como assim, Tinguá, sumiu do nada?


Amigo, só recordo que dançávamos o samba da Porto da Pedra, foi época boa demais. Era o tempo da finada Ivete e falecido Leleco. Fomos para o mangue nos lambuzar, último dia de carnaval, aproveitaríamos ao máximo. Pra quem não sabe, o segundo mês do ano é tempo da "andada" dos caranguejos. A galera gosta de caçar os crustáceos assim, porque é mais de fácil capturar. Os uçás andam pela superfície do sedimento encharcado. Mas nesse dia ficamos irreconhecíveis de tanto besuntar o corpo. O samba nos aguardava no bloco. Que maravilha. Mas deveríamos ser em oito amigos no total. Faltou um, sim, alguém desapareceu, desligou-se da turma. Contei apenas sete. Pois é, acredite, lei de Murphy, foi meu irmão quem sumiu. Ele já não se encontrava conosco. Voltamos correndo. Claro. Necessário descobrirmos o sumiço do meu brother. Seguimos então as pegadas. Catadores seguem rastros no charco por quilômetros. Costume nosso, técnica de profissão, tradição de séculos, aprendemos assim. Meu mano havia sumido. Eu e o grupo todo metemos a cara entre as árvores e na beira da praia pra achar o garoto. Foram horas de busca. Mas achamos, graças a Deus, encontramos.


Mas vocês não perguntaram o que houve?


Sim, sim, mas só questionamos no dia seguinte. Estávamos bastante cansados, precisando dormir. Meu irmão contou depois que, enquanto pegava caranguejos, havia mais sete pessoas também cobertas de lama junto dele. Emitiam sons como nós fazemos no manguezal. Eram assovios idênticos aos nossos. Mas não éramos nós, de jeito nenhum. Eram seres de outro mundo. Apavorante. Algum tipo de entidade, espectro, fantasma, sei lá. Sumiram assim que aparecemos para resgatar meu irmão. E pior, foram embora rindo, debochando. Tenebroso, pra lá de medonho. Gargalharam e desapareceram no ar.


Viu aí, caro leitor, como há situações inexplicáveis em SG? A história teve o desfecho inesperado. Que incrível deve ser a constatação de terem livrado o irmão do Tinguá de algo trágico. Parceiros são para isso. Imagine: acreditando estar com os colegas, o próprio irmão se encontrava na companhia de vultos desconhecidos e peraltas. Seriam seres de outro mundo a praticar traquinagens, só para terem o gostinho de ver a confusão acontecer? Bem, o desfecho demonstra se tratar de um grupo inteiro de seres do além se divertindo também na época de carnaval. Apavorante, definitivamente, deu medo.


Por último, me pego a questionar: onde estarão os tais seres sombrios neste momento, senão a praticar peripécias em nossas noites insones? Duvido que você nunca acordou no meio da madrugada, devido a certos barulhos surgidos do nada ou escutando algum roçar de talheres na pia sem explicação alguma. Pois é, provável que os Sacis de Itaoca tenham escolhido você dessa vez para atormentar.

Erick Bernardes é escritor e professor mestre em Estudos Literários.



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