Olhos de mim
- Jornal Daki
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SÃO GONÇALO DE AFETOS
Por Paulinho Freitas

Lendo Olhos D’água, de Conceição Evaristo, onde ela pergunta a cor dos olhos de sua mãe e busca mostrar ali toda sua excelência, toda homenagem e agradecimento a sua mãe, suas tias e todas as mulheres que passaram por sua vida e a ajudaram a moldar este maravilhoso ser, em que ela se transformou, me deu vontade de olhar para além dos olhos das pessoas e ver lá dentro, qual sua verdadeira cor. Qual seria a cor dos olhos do meu velho pai, que ignorante, semianalfabeto e com o único propósito de viver cada dia, trabalhar durante o dia e dormir a noite o sono de quem olhou os filhos alimentados, cumprindo assim o dever que a natureza lhe impôs?
Qual seria a cor dos olhos de minha mãe, submissa e conformada com a vida que o nosso Deus lhe deu. Acho que ela vivia sua verdadeira vida olhando a fumaça do cigarro que subia e sumia como os sonhos que tinha e não ousava contar, que dirá vivê-los. Quantas mulheres de seu tempo tinham aquela cor de olhos?
E a cor dos olhos de minha esposa que com maestria conduz a vida da família, reclamando às vezes por mais atenção e amor. Amor que tem tanto que divide em partes iguais e doa, como mãe que é, a todos que a cercam?
A cor dos olhos de minhas companheiras de trabalho, que sacrificam-se e se multiplicam em mãe, pai, professoras, amigas, confidentes, espelho dos filhos, casas de sonhos adiados todo final de ano com promessas de realização. Que cor terão?
Amigos de minha idade, que se recusam a ver o tempo que seus olhos teimam em mostrar passando, deixando marcas no rosto, trazendo as reclamações naturais do corpo nos excessos que cometem, qual a cor de seus olhos?
Qual cor dos olhos do motorista do ônibus, da caixa do supermercado, do atendente da farmácia, do profissional liberal que procura, olhando pela janela do escritório, no horizonte, uma forma de quitar os compromissos do mês, dos enganados pelo sistema que se acham empreendedores, mas são apenas empregados de si mesmos, sem direito algum, dos religiosos honestos que vertem lágrimas e oram por seus pares, que exploram a boa fé de fiéis tementes a Deus?
Queria eu, neste momento que olho para o céu nublado, de onde pingos finos de chuva caem e molham o asfalto a minha frente, ter a misericórdia divina e ser ouvido, para perguntar a Deus, qual a cor de seus olhos, já que no espelho que sou dÊle, não vejo a cor dos meus?
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Paulinho Freitas é sambista, compositor e escritor